segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Os elefantes invisíveis

Durante minha trajetória profissional, trabalhei na equipe de um grande Líder com quem aprendi muito. Quando acontecia algo absurdo que, na visão dele, representava uma grande perda de foco e de tempo, ele dizia: “prestamos tanta atenção às formigas, que não percebemos a passagem dos elefantes. ”

Fico imaginando como não perceber a passagem de elefantes..., mas o fato é que eles passam, estão passando e já passaram. E a gente nem percebeu, realmente.

Obviamente que dar atenção às formigas é fundamental. Elas também fazem a diferença. E apesar de seu pequeno tamanho, suas obras são imensas. Mas naquele momento, ele chamava a atenção para o fato de que as formigas estavam bem cuidadas e encaminhadas, mas os elefantes não. As formigas estavam à mostra. Mas os elefantes não. As formigas se mostravam e faziam questão de dizer que estavam passando. Mas os elefantes não.

Formigas e elefantes: dois lados que dão conta das nossas questões e nos chamam a refletir. Mas quem está com boa vontade e disposição para esta conversa?

Ver e perceber as formigas é muito mais fácil. Organizadas, perfeccionistas e previsíveis, no bom sentido. Então, como não perceber que elas estão lá?

As formigas não se escondem. Mostram-se e o caminho delas é conhecido.

No entanto, os elefantes, mudam suas rotas ao primeiro sinal de perigo. São fortes. Atacam e constroem caminhos alternativos para despistarem os inimigos. Vivem em localidades de difícil acesso e dificultam, ao máximo, a proximidade com o homem.

Os elefantes não se mostram. Escondem-se e isolam-se. O caminho deles não é conhecido.

Por tudo isto é que aquele Líder, de verdade, com quem trabalhei, dizia isto com frequência.

Ter atenção para perceber o que realmente importa é para poucos. Perceber formigas é essencial. Mas perceber elefantes é imprescindível. Mas isto é para poucos. Apenas para aqueles cujo olhar se despojou de percepções inúteis e desnecessárias, livres do preconceito e das vaidades. E este olhar é para poucos.

A história abaixo, aparentemente inofensiva e divertida, escrita pelo cronista Sérgio Marcus Rangel Porto, mais conhecido como Stanislaw Ponte Preta, traduz o que trago neste texto. A história é sobre a Velha Contrabandista...

imagem tirada da internet

Havia uma velhinha que sabia andar de lambreta. Todo dia ela passava pela fronteira, montada na lambreta, e carregava um saco atrás. Todos da Alfândega, experientes, começaram a desconfiar dela.

Um dia, quando ela vinha em sua lambreta, e carregando o saco atrás, o fiscal pediu para ela parar e perguntou:

- Escuta, aqui, vovozinha. A senhora passa aqui todos os dias, com esse saco atrás. O que a senhora carrega dentro dele?

A velhinha sorriu com os poucos dentes que ainda restavam e mais outros que adquirira no odontólogo, e respondeu:

- Carrego areia!

O fiscal sorriu e não acreditou nela. Teve a certeza de que ela não carregava areia alguma naquele saco, e mandou que ela descesse da lambreta para examiná-lo. O fiscal, então, esvaziou o saco e dentro, realmente, só havia areia. Envergonhado, ordenou à velhinha que seguisse. E assim ela foi embora.

Mas o fiscal, mesmo assim, continuou desconfiado. Pensou que ela estivesse passando num dia com areia e no outro com muambas, dentro daquele saco. No dia seguinte, quando ela passou em sua lambreta com o saco atrás, o fiscal pediu para ela parar novamente. Perguntou o que ela levava no saco. E, de novo, ela respondeu que era areia. O fiscal examinou e confirmou. Durante um mês o fiscal parou a velhinha e, todas as vezes, o que ela levava no saco era areia.

Aí o fiscal se chateou e disse:

- Olha, vovozinha, eu sou fiscal de alfândega há 40 anos. Reconheço de longe esta coisa de contrabando. Ninguém me convence de que a senhora não seja contrabandista.

- Mas no saco só tem areia, insistiu.

Quando ela ameaçou seguir com a sua lambreta, o fiscal propôs:

- Eu prometo que deixo a senhora passar. Não dou parte, não apreendo, não conto nada a ninguém, mas a senhora vai ter que me dizer: qual é o contrabando que a senhora está passando por aqui todos os dias?

- O senhor promete que não "espaia"?

- Juro, respondeu o fiscal.

- Meu contrabando é a lambreta...

Pois é, quantas lambretas não deixamos passar por estarmos tão obstinados em descobrirmos o que havia no saco.

Sabermos onde estão as formigas e o que há no saco é importante. Faz parte do processo. Mas enquanto estivermos destinando o nosso olhar apenas para isto, nossos elefantes invisíveis passarão, montados em lambretas, sem que percebamos a sua passagem. No máximo, acenaremos para eles, enquanto passarem por nós, como ilustres desconhecidos, sem sabermos o porquê os cumprimentamos e sem sabermos quem eles são...

Nenhum comentário:

Postar um comentário