Muitas são as moedas que nos
alimentam. Moedas físicas, concretas, como o dinheiro, o alimento, a
vestimenta, fundamentais para a nossa estada aqui. E as moedas abstratas como a
saúde, o amor, o tempo. Todas elas essenciais para que a nossa vida tenha sentido,
colorido, beleza e brilho. Valorizá-las é
trazê-las, cada vez mais, para perto de nós.
O texto de hoje dedico ao tempo:
este parceiro invisível, discreto, calado, mas que tem pressa. Ele não costuma
ser prolixo e sabe discernir quando é bem ou mal utilizado. Aos que o
desperdiçam, sua cobrança é implacável. Vinga-se da forma mais cruel: ele não
volta mais. Simples assim. E quando se vê, é Natal de novo. E o carnaval está logo
ali. Aproveitá-lo e usá-lo com sabedoria é uma das virtudes da vida. Perdê-lo
com inutilidades e futilidades autoriza nossas idades avançarem sem ter valido
a pena. É preciso, portanto, não ir por este caminho.
A beleza do tempo consiste na
nossa boa relação que se faz com ele. Ele é uma das nossas maravilhosas moedas.
E como toda moeda, é um símbolo de troca que precisa ser justo para os dois
lados: para nós (que ele seja utilizado a nosso favor) e para o próprio tempo
(que ele seja utilizado para aquilo que é útil e sábio). É preciso lembrar que
ele não aceita desaforos.
O filme abaixo, que exemplifica o que traz o texto, mostra a
trajetória do San Diego Splash, um
time de basquete cujo Tempo foi
justamente homenageado.
vídeo tirado da internet
Após assisti-lo, a vontade que se
tem é de calçar os tênis, se é que já não estão calçados. E se ainda não estão,
a pergunta que fica é: por quê?
A lucidez destas senhoras traz
profundas reflexões e propostas para quebra de modelos mentais falidos, como:
- aquele que
acha que não dá e que não tem tempo;
- que o
desperdiça com crenças limitadoras a respeito de si próprio;
- que se diz
velho demais para começar ou novo demais para parar;
- que tem medo
do sucesso e/ou do fracasso;
- que abre mão
do tentar por medo da crítica de quem o inveja por ter começado;
- que permite
que a vergonha se sobreponha ao desejo de fazer;
- que dispensa
roteiros inteligentes por optar por caminhos longos e desnecessários, como
desculpa para não chegar a lugar algum. E depois dizer que não fez por falta de
tempo;
- que cria
etapas injustificáveis para não concluir o que está fazendo;
- que dá
ouvidos a comentários preconceituosos e limitantes. Afinal, jogar basquete aos 91 anos?
Temos uma relação problemática
com o tempo. Isto é uma realidade. Felizes aqueles a quem o tempo concedeu a
honra da amizade dele. Precisamos estar de mãos dadas com ele a caminho da
mesma direção. Uma direção sustentável, firme e sólida. E para isto, a nossa
travessia é o que importa, como dizia Guimarães Rosa. Se a nossa travessia for
sólida e lúcida, a nossa boa chegada será somente uma feliz consequência.
Portanto, calçar nossos pares de tênis e irmos jogar o nosso basquete,
hoje e agora, é valorizarmos o nosso tempo e a nossa travessia.
O tempo é amigo daquele que se
deixa conduzir por ele. Mas é um carrasco para aquele que se deixa
escravizá-lo. Por ele, apenas podemos vivê-lo da melhor forma que podemos. E
uma das melhores formas de se viver é estarmos calçados com os nossos tênis. A
postos. Prontos.
A idade não deve ser a nossa desculpa,
mas sim a razão da nossa realização. Ela é, apenas, o lembrete mental de que
nossa estada aqui é finita. E que é preciso acelerar para aquilo que, verdadeiramente,
importa.
Façamos do tempo um aliado e não
um adversário que buscamos neutralizá-lo com cremes inúteis e ineficientes. As rugas,
indicativo do passar do tempo, representam mais que marcas físicas: representam
a vida vivida na plenitude. Representam a consciência em paz, do tempo vivido,
com sabedoria. No entanto, a falta delas, indica possibilidades que poderão não
vir.
A juventude é, apenas, a
responsabilidade anunciada da obrigação que se tem de viver certo e viver bem.
A velhice é a pergunta direta da vida nos cobrando o cumprimento desta responsabilidade.
E se vivemos bem a nossa vida, com o tempo ao nosso favor, e ainda de tênis
calçados, haverá um lugar, certamente, para nós, no grupo dos privilegiados.
Dentro ou fora das nossas quadras de basquete, que as nossas limitações
sejam, apenas, a crença na nossa capacidade. Que o “se ao menos” passe para o
“a próxima vez”.
Alguém poderá, então, perguntar:
mas como sustentar tamanha vitalidade e disposição? Não sei a resposta.
Arrogante seria se eu soubesse. Mas desconfio que um dos caminhos para se
chegar a esta resposta, a travessia a qual Guimarães Rosa se referiu, é buscar,
sem cessar, as nossas necessidades e preenchê-las. Sempre e sempre.
Quero encerrar este texto, mas
não a reflexão, com um diálogo entre Alice e o Chapeleiro, da obra Alice no
País das Maravilhas, que diz:
Alice suspirou enfastiada. Eu acho que você deveria fazer coisa melhor
com o seu tempo, ela disse, ao invés de gastá-lo com charadas que não têm
resposta.
Se você conhecesse o Tempo tão bem quanto eu conheço, o Chapeleiro
falou, não falaria em gastá-lo como se fosse uma coisa. Ele é uma pessoa.
Eu não sei o que você está dizendo, disse Alice.
Claro que não, o Chapeleiro disse, sacudindo a cabeça desdenhosamente. É
muito provável que você nunca tenha falado com o Tempo!
Um livro indispensável para
alargar os nossos horizontes. Que a gente fale mais com o tempo e busque
compreendê-lo. Que a gente busque ser amigo dele e considerá-lo, de verdade, como Alguém. Porque ele é. Compreendendo-o,
viveremos melhor a cada dia. E quando nos dermos conta, estaremos calçados com
os nossos tênis sem nos lembrarmos de quando os colocamos. Calçados, significa que estamos no jogo, na
quadra, na vida. E de dentro da quadra, será quase impossível ouvirmos as vozes
daqueles que tentarem nos desestabilizar de alguma maneira, mesmo que estas
vozes também sejam as nossas. Vida longa
ao San Diego Splash!
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