quarta-feira, 28 de junho de 2017

O que é dar certo?

Há muitas perguntas subjetivas na vida, e esta é uma delas. O que é dar certo? Não há uma resposta a esta pergunta. Não há receitas e fórmulas. Quem souber e tiver uma resposta pronta para esta questão, certamente está mal informado.

Gente com fórmulas e receitas prontas para questões complexas e, acima de tudo, subjetivas, não está preocupado em viver, em saborear a vida, em apreciar cada momento aqui, em se aprimorar e servir, mas sim na rapidez para aparecer, no entregar algo, mesmo que este algo seja completamente sem sentido. A preocupação está em corresponder às expectativas, mesmo que não saibamos quais são elas e para que servem.

No entanto, me parece que isto não corresponde ao que pensam aqueles jovens que realizaram uma festa à fantasia, num colégio no estado do Rio Grande do Sul, há algumas semanas. Sob o tema, “se nada der certo”, estes pobres alunos se fantasiaram de vendedores ambulantes, faxineiros, funcionários do Mc Donald´s, pedintes, moradores de rua, cozinheiros, atendentes do Grupo Carrefour. E o mais emblemático: alguns se fantasiaram de ladrão.


imagens tiradas da internet

Triste ver o racismo e o preconceito passeando livremente, sem qualquer tipo de retaliação, ocorrendo em um ambiente cujo conteúdo abordado deveria, por motivos óbvios, ser outro.

Esta festa ocorreu em dois colégios do Sul. E como sabemos que coincidências não existem, os dois colégios são frequentados por alunos de alta renda. O que isto nos traz de reflexões? Muitas coisas. E a primeira delas, é que, certamente, a maioria, senão todos, tem a sua mensalidade paga pelos pais. Estes alunos desconhecem, certamente, os bastidores necessários para que este tipo de mensalidade seja sustentada. Isso para dizer o mínimo.

Obviamente não podemos generalizar. Nem todos os colégios de alta renda realizam este tipo de aberração. Mas, infelizmente, o dinheiro e o poder deturpam e revelam a face dos que não conhecem a ética e o escrúpulo. E foi o que aconteceu nestas duas escolas cujos nomes deveriam ser divulgados como exemplos de desserviços prestados à sociedade.

São exemplos tristes e de uma pobreza inquestionável que sempre devem ser lembrados como modelos educacionais a não serem seguidos.

Após uma repercussão péssima socialmente, alguns pais de alunos e profissionais destas duas escolas desculparam-se em público, dizendo que isto não mais se repetirá. Um pouco tarde, ou não? E muito conveniente pedir desculpas depois que todos perceberam.

Para aqueles que colocam o dinheiro, o poder e o estatus em patamares questionáveis e inalcançáveis, dar certo é sinônimo destas conquistas materiais. E se não atingirem este patamar, não terão dado certo. E a consequência disto? Tornarem-se varredores de rua, por exemplo, na opinião deles.

O que estes alunos ainda não entenderam, se é que um dia entenderão, é que agir da forma como eles agiram e pensar da forma como pensam, isto sim é não dar certo. São pobres cegos no caminho, perdidos em busca de algo para alimentar o ego construído em falsas bases. E quando descobrirem isto, poderá ser tarde demais. Muito tempo terá sido perdido e desperdiçado.

Estes alunos estão construindo um passado por meio deste tipo de atitude. Passado que no futuro será cobrado. Lá na frente, quando olharem para trás, encontrarão, sim, o passado deles, mas serão passados que não terão traduzido uma vida plena de sentido. O passado destes pobres aspirantes a seres humanos traduzirá formas tortas, imprecisas, ininteligíveis, inacessíveis. Uma visão triste do que se transformaram devido à busca pela incoerência.

Quando olharem a si próprios, num futuro incerto, verão insignificância em seus espelhos de ouro e de luxo. Serão prisioneiros do externo, do supérfluo, das aparências, do dinheiro. Uma prisão que até terá as portas abertas, mas como eles estarão com suas máscaras tão presas ao rosto, como disse Fernando Pessoa, não enxergarão a saída das prisões. E lá permanecerão.

Dar certo não há fórmulas, mas caminhos que não o trilhado por estes pobres jovens que já estão e são perdidos, ainda no começo da vida. Uma vida desperdiçada nos disfarces, naquilo que não importa, no desrespeito, no racismo e no preconceito. Isto, sim, é não dar certo.

O mote da festa, em si, estava representado naqueles tristes jovens. Os arrogantes de agora e do futuro. Pessoas cegas que dispensam guias por os considerarem desnecessários. Mas que tropeçam em pequenos obstáculos pela mais pura falta de jeito e de cuidado com tudo o que cerca a vida, a vida de verdade, e não esta que eles vivem.

Uma triste realidade que possui cúmplices: pais, educadores, escola, Estado etc. Mas que somente se pronunciaram após barulhos nas redes sociais e na sociedade, em si. Barulhos?

Até quando vamos agir apenas porque alguém gritou e reclamou? Por que temos tamanha dificuldade de ouvir os silêncios? Silêncios que constroem, que marcam, que edificam e que deixam marcas sólidas e verdadeiras.

Apesar da pouca idade, mas o suficiente para saberem o que fazem, estes pobres jovens encontram-se embrutecidos, cegos e alheios às necessidades do outro, mostradas, todos os dias, pelas janelas das espaçosas sacadas aonde vivem estes pobres jovens. Vivem embrutecidos devido à falta de uma educação ética e sadia, além da baixa moral que possuem.

Não se mede o certo pelo dinheiro, pelo luxo, pelo poder, mas sim pela capacidade que se tem de lidar com as próprias fraquezas, de se aceitar o que se tem e de buscar mais com honestidade e dignidade. Reconhece-se que o outro está no caminho do dar certo quando assume, sem hipocrisias, a sua condição de incompleto e de imperfeito. A imperfeição e a incompletude são características dos fortes e dos que estão no caminho do dar certo.

Deveríamos ser medidos pelas perguntas que fazemos e não pelas facilidades que buscamos e que temos, na vida. Deveríamos ser valorizados pelas construções que ajudamos a levantar e não pelos títulos que temos, muitas vezes custeados pelos pais e sem sentido algum.

Denegrir a imagem dos trabalhadores expostos nas fotos, somente evidencia o conceito torto e impreciso que estes jovens têm sobre eles mesmos.

Dar certo é uma questão moral. É aprender a lidar com as nossas pequenezas, incertezas e inferioridades. Isto independe da profissão e da condição social e financeira. Mas aqueles pobres jovens, falidos em conceitos preconceituosos e infelizes, demorarão bastante tempo para fazerem esta descoberta.

Dar certo é assumir o nosso ínfimo tamanho frente àquilo que precisa ser feito. É assumir que nada somos. E que o pouco que sabemos revela quem somos, como disse o Filósofo. E aqueles pobres jovens nada sabem. Ou melhor, pouco sabem sobre a vida. E o que pensam que sabem camufla a imagem deles refletida no espelho: uma imagem de alguém cuja índole enferrujou.

E não se espantem, pobres jovens, se ao buscarem estes menosprezáveis trabalhos por conta de nada mais ter dado certo, vocês encontrarem as respostas para o que seja dar certo. E, espantados, aprenderem o significado de palavras como valores, ética, moral, decência que serão incluídas, por compaixão, no dicionário de vocês. Dicionário que não constava naquela listinha de materiais comprados para vocês, pelos pais, quando iniciaram suas vidas, inclusive escolares.

Quero encerrar este texto, mas não a reflexão, com uma provocação de Einstein, que diz:

“Não tente ser bem sucedido; tente, antes, ser um homem de valor.”

Dura e necessária reflexão. O convite de Einstein e de tantos outros que vão à frente já foi feito. Resta a nós aceitá-lo ou não. A nossa decisão será determinante para, de verdade, darmos certo na vida.

Quando o nosso olhar não puder mais distinguir os presidentes de Empresas e os limpadores de rua, teremos merecido, então, ocupar um lugar na categoria dos que deram certo na vida, de verdade.

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