A semana que passou foi muito
triste para mim. Particularmente muito triste. Perdi um amigo.
Um amigo todo branquinho, peludo,
da raça poodle, que não pesava mais
que três quilos e meio. Chamava-se Barthy. Ou melhor, chama-se Barthy. Aprendi que utilizar o tempo verbal no presente eterniza
sobre o que se fala e/ou sobre quem
se fala. E o Barthy estará sempre nas nossas memórias, sempre presente em
nossas vidas.
Um amigo cão.
Barthy foi um cão feliz.
Literalmente posso dizer que ele teve uma vida de cachorro. No melhor sentido
que esta construção possa ter. Sempre teve amor da família, atenção,
alimentação, caminha confortável e, principalmente, respeito. Ele nos amava e
nós o amávamos. Sei disto.
Ele se foi de velhice. Viveu
quase 16 anos. Faria aniversário em 14 de dezembro. Nunca teve problemas de
saúde, nunca precisou tomar remédios na vida. Um cachorro saudável que viveu a
totalidade de tempo que sua raça e espécie permitiram. E sem dores e sem
sofrimentos. Apenas nestes últimos quinze dias ele começou a apresentar
problemas na lombar, sua circulação foi dando sinais de cansaço, e ele se foi
da forma mais linda que pode haver: nos braços de quem o amava muito, também:
minha irmã, a mãe dele.
Até nesse momento triste de
despedida, ele não deu trabalho. Foi embora de forma rápida e indolor. Mas sei
e acredito que a despedida foi temporária: Barthy vive. Não aqui, mais. Mas num
outro lugar, num outro plano aonde ele possa descansar e continuar brincando.
Acredito nisto. E que bom que acredito nisto. As nossas crenças nos determinam.
Fica a saudade. E quanta saudade!
Cheguei a ouvir o latido dele durante a semana, acho que de tanta saudade que
sinto. A última vez que nos vimos, há poucas semanas, fiquei um tempão com ele
no colo. Como era o costume! Ele adorava um colo. Num momento, ele apoiou sua
cabeça no meu pescoço e pude sentir o seu focinho, sua respiração. Só para quem
ama animais pode imaginar o sabor delicioso desta sensação. E depois, o levei
para tomar água e comer um pedacinho de tomate, que ele fez com gosto. E ainda
lambeu meus dedos e minhas mãos.
Que gostosa esta convivência!
Obrigada, amigo. E que conforto que dá saber que você foi um cão feliz! E que
viveu a plenitude da sua vida. Obrigada, amigo! Obrigada por ter trazido
somente alegrias para as nossas vidas.
Como um bom sagitariano, uma de
suas principais características era a sinceridade. Quando ele não gostava de
alguma coisa ou de alguém, era visível. Latia, rosnava, resmungava. Ficava
bastante inquieto quando algo o incomodava. E quer saber? Na maior parte das
vezes ele estava certo: ele sempre latia para pessoas esquisitas, que não
gostavam de animais e que tinham uma energia pesada.
Respeito quem não gosta de
animais. Cada um com suas escolhas. Mas não sei se são pessoas boas e
confiáveis. Desculpe se ofendo alguém. Mas somos livres para expressarmos as
nossas opiniões. Penso que quem não gosta de animais é só porque ainda não teve
a oportunidade de conviver com eles. Depois da convivência, duvido resistir a
um chamado deles.
Como diz a música “Samba da minha
Terra”, de Dorival Caymmi: “Quem não gosta do samba bom sujeito não é...ou é
ruim da cabeça ou doente do pé...”, parafraseando esta bela música...”...quem
não gosta de animais bom sujeito não é...ou é ruim da cabeça ou doente do
pé...”. Além disto, a convivência com animais nos faz pessoas melhores.
Acredito nisto também.
Quando minha irmã viajava, o
deixava conosco, em casa. Minha mãe cuidava dele. E que delícia era chegar à
noite, em casa, e saber que ele estava lá. Quando eu saía do elevador e tocava
a campainha, lá vinha ele com o seu focinho redondinho embaixo da porta,
cheirando, só esperando que eu entrasse. E quando isto acontecia, ele ficava
pulando em mim pedindo para pegá-lo no colo. E que dificuldade era pegá-lo no
colo! Era o que mais eu adorava fazer: ficar com ele no colo.
Numa das vezes em que ele estava
conosco, cheguei do trabalho muito triste. Tinha tido um dia muito difícil. Cheguei
muito cansada, brinquei pouco com ele e fui tomar um banho. Depois jantei e me
sentei no sofá para tentar descansar um pouco. Realmente naquele dia eu não
conseguia me doar mais, estava muito cansada. Liguei a televisão, me sentei no
sofá e só senti um focinho molhado encostando na minha mão. Era o Barthy. Olhei
para ele. Ele levantou a cabeça e olhou para mim, também. Como que entendendo o
que acontecia, e sem nada me cobrar, abaixou a cabeça dele e só ficou ali ao
meu lado, sem me pedir e sem me cobrar absolutamente nada. Nunca vou me
esquecer desta demonstração de carinho, de amor e de solidariedade, algo raro
em nós, humanos. São poucos os que fazem, de verdade, isto. Nada me pediu em
troca. Muito pelo contrário: foi ele quem me fortaleceu. E ficamos os dois ali,
assistindo televisão, quietos, juntos. Não era necessário dizer algo. O
silêncio, muitas vezes, fala por si. Mas é preciso saber ouvi-lo.
Aprendemos muito com eles, não só
com os cães, mas com todos os animais. São sábios, simples e sabem olhar para a
vida além do que ela mostra. Sabem olhá-la com os olhos do coração e para o que
realmente importa. Respeitam a vida e só atacam a nós quando nós o atacamos em
primeiro lugar. Só que é preciso lembrar que se eles nos atacam será por pura
defesa e instinto. Não são vaidosos, não querem o poder, não puxam o tapete de
ninguém. São amigos sinceros e solidários. Respeitam a natureza. Respeitam a
si.
Quanto podemos aprender com eles,
animais!
Nestes últimos dias em que o
Barthy esteve debilitado, minha irmã precisou se ausentar do trabalho. Não
havia como deixá-lo sozinho. Ela é Professora. Conversando com a Coordenadora
de Ensino sobre a situação e pedindo um pouco de compreensão, recebeu a
seguinte resposta:
“Você vai precisar escolher. Ou
você fica com o seu cão ou você
escolhe o seu profissionalismo. Deixar de trabalhar por causa de um cachorro? ”
Pessoas infelizes não são dignas
de críticas, mas sim de piedade. Acho que este raciocínio se encaixa bem a esta
pessoa. Há pessoas no mundo que congelam em função da frieza delas. Mas não
percebem em função de suas duras cascas. Só mesmo os tropeços da vida serão
capazes de mudar a rota destas pessoas.
É inquestionável a necessidade do
trabalho. Mas aqui se fala de algo além, extremamente superior, e sem
comparação: solidariedade, compreensão, estender as mãos, caridade. Mas como pedir
isto a este tipo de pessoa?
Nem preciso dizer a escolha de
minha irmã: o Barthy. E ela arcou com todas as consequências de sua escolha, de
sua feliz e acertada escolha. Num mundo em que se abandonam pessoas, como
reparar em quem tem este tipo de atitude perante a um cachorro, a um animal?
Tento encontrar outra palavra, mas acho que piedade é a que melhor se encaixa,
mesmo. São pessoas dignas de piedade. E, independentemente, de nossas crenças religiosas e se é que temos alguma,
achar que não há reação para as nossas ações, é pura ilusão. É viver no mundo
encantado. Tudo o que fazemos e tudo o que não
fazemos sofrerá reações, efeitos. Seja para o bem ou para o mal. Portanto,
é preciso que saibamos que todos nós prestaremos contas de todas as portas que
fechamos às pessoas que nela bateram. E o inverso também é verdadeiro: que não
serão em vão as portas que abrimos a quem tocou a nossa campainha. Isto é um
fato, independentemente de quem acreditar ou não. Quem não acreditar nisto, só
estará exercitando o seu poder de alienação, coisa muito comum e nossa parceira
diária.
As nossas escolhas são as
direcionadoras de nossas vidas. É preciso saber escolher. Escolhas bem-feitas,
vida feliz; escolhas malfeitas, vida infeliz. Quem é feliz, olhe para as suas
escolhas: você encontrará uma resposta do motivo de sua felicidade. Quem é
infeliz, olhe para as suas escolhas: você encontrará uma resposta do motivo de
sua infelicidade. Isto é a nossa vida. Somos estas duas coisas. Mas nem todos
dedicam tempo para acertarem as rotas. E quando se derem conta, será preciso
refazer o caminho. E refazer o caminho não me parece uma coisa agradável. Cada
um de nós deve ter uma história para contar sobre isto.
Enfim, quero encerrar este texto que
escrevi para homenagear o meu amigo Barthy com um “Muito Obrigado, amigo! ”, e
também deixar duas reflexões para todos nós:
“A grandeza de uma nação pode ser
medida pela maneira como seus animais são tratados. ” - Mahatma Gandhi
“Compaixão pelos animais está
intimamente ligada à bondade de caráter, e pode ser seguramente afirmado que
quem é cruel com os animais não pode ser um bom homem. ” - Arthur
Schopenhauer
O que falar sobre Gandhi? A obra
dele fala por si. Mas há uma coisa que não posso deixar de falar: que Gandhi lutou pela transformação do mundo, para
que fosse um lugar melhor de ser vivido. Ele foi o maior defensor do princípio
da não agressão e da não violência. Só
isto ele buscou.
E sobre Arthur
Schopenhauer, o que dizer? Também a obra dele fala por si. Como um
dos grandes Filósofos da História, tinha como uma
de suas metas de vida, o Amor.
Acho que vou apresentar Gandhi e Schopenhauer àquela
pessoa que se diz Coordenadora de Ensino.
E que tristeza uma pessoa com estes pensamentos atuar na área da Educação.
Em qualquer área isto seria crítico. Mas na área da Educação, é preciso concordar
que é, no mínimo, irônico.
Mas é preciso descongelar a alma
e o coração para entender as palavras de Gandhi e de Schopenhauer.
O convite para este descongelar
nos chega diariamente. Mas às vezes, muitos de nós estamos ocupados com coisas
desnecessárias para ouvirmos a este chamado. E acho que este é o caso daquela
pessoa. Mas a vida ensina. À maneira dela, mas ela ensina. Lembrando que a vida
não costuma ser muito gentil em seus ensinamentos para quem escolhe caminhos
tortos. Mas isto é assunto para outro texto!
Mais uma vez: Obrigada, amigo!
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