Há alguns anos, pesquisadores da
área educacional fizeram a seguinte experiência com crianças de diversas
nacionalidades: pediram para elas se sentarem próximas às mesas e aguardarem,
pacientemente, um doce que ganhariam. E assim foi feito. Os pesquisadores deram
um doce a cada uma delas e disseram:
- A partir deste momento, quem quiser, pode comer o doce que
ganhou. Mas quem esperar até amanhã
para consumi-lo, ganhará outros dois doces para compensar a espera. Vocês
escolhem. E assim, os pesquisadores se retiraram da sala e ficaram observando
as crianças.
Ao fim da experiência, os
pesquisadores notaram que poucas foram as crianças que aguardaram o dia
seguinte. Mesmo com a certeza de que receberiam mais doces no dia seguinte, o prazer imediato falou mais alto, em
detrimento do prazer de longo prazo.
Esperar até amanhã é muito tempo para aquele que duvida da vida.
Em conversa com os responsáveis
pela educação das crianças que optaram por esperar o dia seguinte, os
pesquisadores descobriram, nestes responsáveis, no caso os pais, um baixíssimo
nível de ansiedade, uma valorização crescente da educação em si, um respeito
pelo próximo, o saber esperar e um saber construir, um planejamento para o
amanhã. E, na contrapartida, pais excessivamente ansiosos do outro lado,
necessidade desenfreada de resolver isto hoje, falta de planejamento e
desorganização da rotina.
Obviamente que generalizar não é
o correto. Certamente existem pais ansiosos cujos filhos são planejados e
calmos, e pais tranquilos com filhos agitados e inquietos. Mas o que a pesquisa
chama a atenção é para as probabilidades,
ou seja, num cenário no qual a criança tenha o exemplo ou o contraexemplo de
determinada coisa, a chance de ela seguir o caminho mostrado e exemplificado será
bem grande.
Consumir a bala no momento que se
ganha não é errado. É nossa escolha esperar o dia seguinte ou não, desde que assumamos esta postura e esta
escolha. Saber os riscos e os ganhos do curto e do longo prazos precisam estar
claros para todos nós.
Certamente as crianças da
pesquisa não possuem a dimensão do curto e do longo prazos. Mas este
comportamento delas trará importantes diagnósticos futuramente.
Aquele que sabe esperar e enxerga
valor nisto toma, sempre, as melhores decisões. Está ciente e seguro desta
garantia. A espera o fortalece. A
espera, para aquele que optou pelo longo prazo, é sua companheira e melhor
conselheira. A espera oferece um refúgio para o autoconhecimento. Um dos
melhores lugares para o autoconhecimento se apresentar é na espera, nas horas e
dias que passam sem respostas. Mas a resposta de amanhã chegará.
Aquele que age pelo impulso e
pela triste crença na ausência do amanhã, certamente consumirá o doce hoje, no
curto prazo. Não está certo e nem seguro. Não acredita em garantias. A espera o
enfraquece. A espera o angustia. O relógio deixa de cumprir o seu papel e passa
a requerer paradas frequentes de seus ponteiros, no mesmo lugar.
Saber esperar, de verdade, é uma arte. Uma espera que
sustenta, que fortifica, que solidifica.
Abrir mão de prazer pontual para
receber outro mais compensador, duradouro e melhor: é esperar com critério. E
não a espera pela espera. É uma espera que se desdobra na esperança de que o
melhor está a caminho. E está próximo.
Ter esperança é sinônimo de saber
esperar. E aquele que sabe esperar, portanto tem esperança, é uma pessoa mais
feliz. Feliz porque tem menos necessidades. Menos demandas. Menos requisitos a
serem preenchidos.
Saber esperar é ter fluência na
vida. É não brigar com ela.
Será que a Lua apressa o
pôr-do-sol para que ela possa brilhar logo mais à noite? Será que a semente
cobra, da terra, um desenvolver mais rápido?
O curto prazo deve ser acionado
para aquilo que é urgente, não, necessariamente, importante. E muitas vezes uma
coisa se torna urgente porque deixamos de fazer e de contemplar o importante, o
imprescindível.
O longo prazo deve ser acionado
para aquilo que é importante, atemporal, para aquilo que verdadeiramente
importa. Mas quem se importa com isso?
Abrimos mão de cozinhar o arroz
integral porque demora muito. Então comemos o branco, mesmo, que, apesar de não
ser tão bom, dá menos trabalho e fica pronto rapidamente.
Corremos contra o tempo para
darmos conta de fazermos o planejado para aquele dia. E nem percebemos que,
muitas vezes, esta correria é fruto da falta de planejamento de longo prazo.
Falamos ao celular com tamanha
destreza; nas redes sociais, nos posicionamos com forte veemência; criamos
demandas com facilidades; falamos alto coisas desnecessárias... o celular como
um instrumento sem o qual não vivemos.
Vivemos sem caráter e sem educação, mas todos temos um celular! O
curto e o longo prazo pedindo redirecionamento. Mas e o tempo para olhar isso?
As redes sociais, a facilidade do post, do like, do repasse sem a
preocupação dos danos causados: a tela do computador nos protege. O curto prazo
nos esconde em telas que aceitam tudo, sem filtros. Mas o longo prazo, a vida real, não nos esconde. Pelo
contrário, nos expõe e nos convida a resolver e a tratar as nossas questões.
O curto prazo que falha, mas que a vaidade esconde. Por interesse.
O longo prazo que acerta, mas que a vaidade também esconde. Por
interesse, também.
Queremos fazer depressa para
compensar nossa necessidade de entrega. A qualidade não importa muito. A
rapidez não cobra qualidade; a qualidade cobra e é implacável.
O curto prazo alimenta nossa sede
de aparecer. Aquele que opta pelo curto prazo sempre está presente, sempre está
sendo visto. É aquele que está sempre no raso, no supérfluo, na periferia, na
marginal. É aquele que sempre opta pelo doce imediato. E, ao amanhecer, ao se
dar conta de que poderia ter, agora, três doces e não, apenas um, tenta
ludibriar o próximo para dividir o doce com ele e, não conseguindo, busca, por
meio da covardia, desmerecer e diminuir os doces ganhos pelo próximo.
Curto prazo. Longo prazo.
Escolhas e renúncias. Imediatismo e paciência. Somos tudo isto que luta,
diariamente, para se impor e sobressair no nosso mundo de iguais e de
desiguais. Importante, pois, nos lembrar de que, diferentemente do público com
quem a pesquisa foi realizada, não somos mais crianças para nos escondermos em
doces e fazermos de conta que somos inocentes. A inocência e a ingenuidade são
atributos que constroem uma personalidade. E aquelas crianças, inocentes e
ingênuas, que optaram por seus doces no curto ou no longo prazos, podem se beneficiar
do luxo que é o de ser criança. Mas nós, adultos há tempos, sabemos os custos
do curto e do longo prazos. Portanto, seja qual for a nossa escolha, que os
riscos e os ganhos sejam assumidos de todas as escolhas que fizermos, mesmo
que, do outro lado, vejamos o nosso vizinho com mais doces que a gente.
O curto prazo do post em
detrimento do longo prazo da reflexão e do respeito.
O curto prazo favorece o fast, o rápido, o urgente, a entrega, o
lançamento, a vaidade.
O longo prazo favorece a
sensatez, o pensar, a solidez, o caráter.
Curto e longo prazos: dois lados
que nos representam, que nos identificam como seres inacabados e imperfeitos.
Mas o caminho continua.
Por que optamos pelo curto prazo?
Por que optamos pelo longo prazo? Quando soubermos estas respostas e estivermos
confortáveis com elas, nossas escolhas terão mais qualidade e sofreremos menos.
O imediatismo que consome nossas
horas, que nos induz a escolher o doce para consumi-lo hoje porque não
acreditamos que o amanhã chegará. Uma
crença na ausência.
São escolhas. São decisões. Não
há roteiros e nem respostas prontas, somente perguntas.
Quero encerrar este texto, mas
não a reflexão, com um pensamento de Clarice Lispector, que diz:
“O tempo corre, o tempo é curto;
preciso me apressar, mas ao mesmo tempo viver como se esta minha vida fosse
eterna. ”
Que a pressa, portanto, não nos
atrase. E que se formos valorizar o curto prazo, que seja, apenas, como instrumento de limpeza do desnecessário, do inútil, do
vaidoso e do sem ética, para que o longo prazo possa ter mais espaço em nossas
vidas e ser utilizado para o que, de verdade, importa.
E ter esperança nos doces que
virão e saboreá-los é um exemplo de se fazer o que, verdadeiramente, importa.
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