segunda-feira, 27 de julho de 2015

Os paradoxos que não são nossos

Como assim, paradoxos que não são nossos? No mínimo contraditório...

Somos seres contraditórios, paradoxos, em constante movimento de descobertas sobre nós. Fazem parte de nossa essência. Mas como são contraditórias as nossas contradições e contraditórios os nossos paradoxos, fazemos de conta que não são nossos. E assim vamos.

Quero dormir, mas não posso. E quando posso não tenho sono.

Quero falar, mas não me perguntaram nada. E quando me perguntam, não sei o que dizer.

George Carlin, humorista norte-americano, tem uma frase que diz:

“O paradoxo dos nossos tempos é que temos edifícios mais altos e pavios mais curtos; estradas mais largas e pontos de vista mais estreitos. ” E ele tem toda razão.

A questão é que dificilmente assumimos que os pavios mais curtos são os nossos; achamos que as estradas não estão tão largas assim, e o nosso ponto de vista sempre é dado de uma altura que a vista do outro não alcança. Então o nosso está sempre certo!

Figura retirada da internet

Porém, o que não percebemos é que o nosso ponto de vista nos aprisiona da nossa vista. E aí, o ponto de vista do outro pode estar certo. E em muitas vezes está.

Quando pensamos que estamos indo, voltamos; e quando voltamos, está na hora de recomeçar. Esta é a vida: paradoxos, contradições, dúvidas e certezas.

Uma vez perguntaram para a atriz Fernanda Montenegro quantos pregos ela tinha visto naquele dia. Estranhando a pergunta, ela respondeu: “Não sei, acho que nenhum. É difícil encontrar um prego.” Responderam a ela: “Difícil porque você não observou. Tente observar, a partir de agora, e veja quantos pregos você encontrará. “ E assim ela fez. E no dia dessa entrevista ela disse, rindo, que realmente passou a encontrar mais pregos em sua vida.

Utilizando este raciocínio, passei a observar exemplos de contradições e paradoxos que existem. E realmente foram muitos os que encontrei:

- sobre o juramento dos médicos ao receberem os diplomas: “…Praticarei a minha profissão com consciência e dignidade. A saúde dos meus pacientes será a minha primeira preocupação...”. Sem generalizações, não é isto o que encontramos.  Recentemente foi descoberta uma quadrilha de médicos que forjava pedidos de cirurgias desnecessárias, referentes a pacientes saudáveis. Desta forma, estes “profissionais” recebiam o valor do convênio e de instituições públicas. Há outros que pedem os exames aos poucos, aos pacientes. Desta forma, podem cobrar novas consultas. Triste contradição: aquele que deveria zelar pela nossa vida, a transforma num comércio;

- paramos o nosso carro na vaga do idoso porque vamos “só até ali”. Uma vez um repórter flagrou uma motorista cometendo esta infração e ao ser questionada, respondeu: “Ué, mas não tem vaga para mim…o idoso tem mais tempo do que eu…”;

- a escola que deveria educar, mas não educa; a rua, que não tem este papel, educa. Tortamente, mas educa;

- muitos frequentam a escola, mas saem quase analfabetos: ainda temos milhões de analfabetos num País cuja Educação é um direito, porém não exercido;

- a mentira que de tanto ser contada torna-se verdade;

- a novela das nove perdeu audiência porque a homossexualidade de duas personagens mais velhas foi rejeitada. Por que esta rejeição? Por que são atrizes de mais idade? Por que são consagradas? Por que achamos feio? Qual é o problema senão o paradoxo do nosso SER?;

- o carro que tem tantos cavalos, mas de verdade, como e aonde usá-lo?;

- o nosso celular que é tão veloz, mas que nunca temos aquele “minutinho” para falar com um amigo. “Está uma correria. Eu ia te ligar, você acredita?” Falamos isto, não falamos?;

- a rapidez que paralisa;

- aquela promoção de uma pessoa a um cargo de liderança, que não possui um traço de liderança, e que foi promovida por uma outra pessoa que não entende nada de Liderança…

São muitas as reflexões…

Vivemos cada vez mais trancafiados, mesmo com o sol nos convidando para um passeio.

Vivemos num País de fartura em meio à pobreza. Poucos com tanto; muitos sem nada.

Uma dona-de-casa, do Rio de Janeiro, foi entrevistada no momento em que comprava tomates, na feira. E ao ser questionada sobre os preços, disse: “às vezes recorro à xepa”. Mas o Congresso continua andando com carros importados e com motoristas particulares, que, acredito, não conhecem a “xepa”. Eles podem? Não. O dinheiro que eles usam é nosso.

Somente o setor bancário lucrou vários bilhões de reais neste semestre, e no outro, no outro…

Somos um povo endividado e que permite se deixar estimular para o endividamento. Isto explica este assombroso e vergonhoso lucro. Uma vez perguntaram a um conhecido banqueiro brasileiro: “ O Senhor não acha que lucra muito?” E ele respondeu: “Vocês, jornalistas, só olham para os nossos ganhos. Mas temos muitos gastos, também.” Confesso que fiquei até com pena! Estes, também, não conhecem a “xepa”, daquela dona-de-casa.

Nossa sociedade é produtora de medos. Depois ela vem com a solução para vendê-la a nós. E a gente compra em dez vezes no cartão.

O governo utiliza a palavra manobra como sinônimo de adequação às necessidades do cenário. Mas acho que eles têm um dicionário próprio. No nosso, manobra, significa dar outro destino para uma promessa que eles não cumpriram.

O ponto final encerra um raciocínio; a vírgula é uma breve pausa; e o ponto-e-vírgula é uma pausa maior. Assim é. Mas teve um jornalista famoso que disse que “na dúvida quando utilizar estes três, utilize o ponto”. Isto é o que dá se meter naquilo que não conhece. Por que ele não cuida só das matérias dele? Estaria de bom tamanho, não?

Os americanos orgulham-se da educação que possuem, mas não conseguem dar conta do racismo. Que só vai ser extinto quando nos preocuparmos menos com Harvard e Stanford, e mais com o que bate a nossa porta, mas insistimos em não abri-la. Há muitas coisas relevantes se passando fora dos portões de Harvard e de Stanford.

Harvard é importante, mas quem tem acesso a ela? Harvard é para poucos. No máximo, conhecimento sobre pesquisas que são feitas e mesmo assim, depois do filtro que os jornais locais fazem.

Os intelectuais do Vale do Silício restringem o uso de eletrônicos de seus filhos. Este é o melhor e mais provocador de todos os paradoxos.

Um garoto de 15 anos, brasileiro, ganhou medalha de ouro na Olimpíadas de Matemática, e está a caminho dos EUA para estudar. E o Josenildo, um cidadão do Piauí, que chorou ao conseguir ler o letreiro do ônibus, pela primeira vez, como recompensa por participar do Programa de Alfabetização de Adultos, da Igreja de seu bairro.

Queremos as medalhas, mas tropeçamos no verbo to be. Que não significa somente ser e estar, mas a dúvida sobre “queremos ser ou não. ” Esta é a questão. Foi isto que Shakespeare disse, já naquela época. Gênio. E ele nunca se preocupou em ganhar medalhas. Quando se é bom, as medalhas chegam até você, não precisa se preocupar com elas.

Precisamos acordar cedo mas vamos dormir tarde.

Achamos que somos solidários, mas por que não doamos nem o nosso supérfluo?

Há um abismo entre o querer ser e o que realmente é. Fazemos questão de esconder o abismo. No mínimo, se ele insistir em aparecer, diremos que é uma pequena rachadura que se deu devido à chuva.

Um chefe de poder do nosso País, ao ser investigado, disse que “não vai admitir que uma AUTORIDADE, como ele, seja tratada desta forma. ” A pergunta que fica é: que forma? Por que ele não pode ser investigado? Ele não deve conhecer a tal da “xepa”.

Somos paradoxos. Temos paradoxos. Criamos paradoxos. Sustentamos paradoxos. Perpetuamos paradoxos.

“Não tenho medo do escuro, mas deixe as luzes acesas”, diz a música.

O estilista que disse, numa palestra, que a marca dele não fazia numeração acima do 42 porque era feio. “Não veste bem”, disse.

Um turista disse que somos “acolhedores”. Mas e a “Gordofobia”? E a Homofobia? Ainda bem que ele ficou tempo insuficiente aqui para descobrir...

Difícil andar quando o cansaço das pernas não te permite dar um passo além.

Mover-se quando a vontade é de se recolher. Falar quando a vontade é se calar.

Quem está lá fora? Quem será? Ligou antes para dizer que vinha?

Querer respostas, mas não saber uma palavra depois do “e agora? ”

A velhice não valorizada. O culto à juventude se dá numa sociedade de curto prazo. Somente fica jovem quem morre cedo. A juventude é jovem demais para saber disso.

Mas o saber requer tempo, que somente quem viver terá oportunidade de desfrutá-lo.

Conseguir ver o sol, apesar do cinza, é para poucos.

A promessa sem promessa de ser cumprida. “Passa lá. ” “A gente se vê. ” “A gente se fala. ”

A informação que parece desinformação. De que adianta tanta informação se não sabemos o trajeto?

A consistência e a regularidade viraram caretas e ultrapassadas.

O desafio é conseguir ser rápido, porém sem tanta pressa. E assim, nos disciplinarmos para que tenhamos a liberdade de desobedecer.

Enfim, o paradoxo dos nossos dias, dos dias de ontem, de anteontem, os de amanhã e os de depois de amanhã. E os que virão.

Aceitar que nem sempre vão pedir a sua opinião. E se pedirem, muitas vezes será somente por educação, e não por interesse verdadeiro.

Como dar conta disso tudo? Eis a questão, como disse Shakespeare.

Um caminho talvez seja o de aceitar que a gente não vai dar conta de tudo. Ou você achou que daria? Somente aquele que assume sua pequenez pode se dizer grande.

Está aí outro paradoxo que merece uma boa reflexão.

domingo, 19 de julho de 2015

Os gigantes vão ao longe

"Se cheguei até aqui foi porque me apoiei nos ombros dos gigantes".

Em minhas pesquisas, encontrei variações desta frase como:  “Se eu vi mais longe, foi por estar de pé sobre ombros de gigantes” e "Se vi ao longe é porque estava nos ombros dos gigantes”. São creditadas ora a Isaac Newton, ora a Aristóteles. Como não encontrei um consenso, pedi licença para eles para utilizar a frase em meu texto. Eles concordaram desde que eu dividisse os créditos entre eles.

Enfim, tudo esclarecido, créditos dados. Penso que esta frase encerra reflexões atemporais e pode ser pensada sob vários aspectos. Escolhi falar sobre o poder que a alienação tem sobre nós, quando optamos por este caminho, ao mesmo tempo o poder que o conhecimento tem sobre nós, quando optamos por este caminho.

Alienação e Conhecimento. Caminhos inversos. Caminhos opostos. Caminhos que caminhamos. Caminhos que pertencem a nós. Caminhos que ajudamos a construir. Caminhos que só existem porque passamos por eles e deixamos as nossas marcas.

Muitas de nossas alienações vêm, obviamente, do desconhecimento, do não saber, daquele saber que nos foi ocultado, ou seja, mesmo que queiramos, não vamos saber. Pelo menos, não agora. Mas há aquele tipo de alienação que habita em nós e que alimentamos diariamente. É o tipo de alienação que nos corrói e mina a nossa capacidade de crescer como seres autônomos que deveríamos ser. Mas que ainda não somos, pelo menos não no nível que deveríamos.

Esta alienação que alimentamos colabora, e muito, para que esta autonomia se distancie de nós a cada dia. É uma alienação confortável, quentinha, preguiçosa, que nos protege e corrobora com a nossa máxima: “Sério? ” “Quando? ” “Ah, eu não sabia...” “Se eu soubesse...”.

No fundo no fundo, bem lá no fundo, a gente sabe que deveria saber, mas os desdobramentos do saber nem sempre são confortáveis e quentinhos. E o pior: depois que descobrimos que sabemos, não dá mais para dizermos “Sério? Quando? ”.

E a preguiça? Ah esta companheira de todas as horas...que acolhe a nossa cômoda ignorância..., mas você pode dar adeus a ela depois do saber, do caminho descoberto, do arregaçar de mangas.

A alienação, portanto, tem o seu valor: nos esconder de um mundo que terá cada vez menos respostas e que fará cada vez mais perguntas. Um mundo que terá cada vez menos muros e que te convidará a derrubá-los, se você tiver a ferramenta certa para isto. Para derrubar muros, a alienação não será necessária. Aliás ela é ótima para construí-los. Mas para derrubá-los, um bom martelo para descortinar o que estiver será muito bem-vindo.

Platão, filósofo grego, da antiguidade, mas que de antigo não tem absolutamente nada, escreveu um livro conhecido mundialmente: “A República”, e nele consta uma passagem muito estudada, chamada “O mito da caverna”, que talvez seja um dos textos filosóficos mais lidos e comentados, no mundo.

O mito diz que, numa caverna, viviam homens amarrados e acorrentados que não podiam mudar de posição. A única coisa que conseguiam fazer era olharem para a parede do fundo da caverna. A frente da caverna possuía uma pequena abertura e abrigava uma fogueira, mas os habitantes da caverna não podiam vê-la porque estavam de costas.  Em frente à entrada da caverna havia um muro de tamanho médio e, por trás dele, alguns homens se movimentavam carregando, sobre os ombros, estátuas trabalhadas que representavam várias figuras e imagens. Isto criava sombras no interior da caverna, projetadas pela luz da fogueira. Além disto, as vozes destes homens ecoavam e os habitantes podiam ouvi-las.

Como aqueles habitantes não conheciam o mundo externo e as únicas coisas que tinham eram as sombras projetadas e as vozes, começaram a acreditar que aquelas sombras eram a única e verdadeira realidade. E que o eco das vozes seria o som real das vozes emitidas pelas sombras.

O mito traz, ainda, uma suposição: de que se um dos habitantes conseguisse se soltar das correntes, ele buscaria esta luz, esta claridade que viria de fora e se habituaria a este novo mundo que se apresentava para ele. E de posse desta nova realidade, começaria a entender o que significavam aquelas sombras, aquelas imagens. Desta forma, ele voltaria à caverna para contar a novidade aos que ficaram ali e, assim, ajudá-los a se libertarem. Mas quando ele volta, é chamado de louco e é morto por seus companheiros.

Este texto é bastante utilizado e muito já se debateu sobre ele. Um dos pontos importantes de interpretação é que nós (representados pelos prisioneiros da caverna) acreditamos muito naquilo que nos é dito, acreditamos em imagens criadas que nem sempre refletem a realidade. E o mais crítico: replicamos modelos ineficientes que aprendemos e que nem sempre promovem o bem, o aprendizado, o desenvolvimento, a autonomia.

Todos daquela caverna tinham o mesmo comportamento: o de olharem para a parede e acreditarem naquilo que viam. Mas aquilo que viam (imagens distorcidas da realidade) não era o verdadeiro, o real. E mesmo depois, quando um dos habitantes libertos volta para trazer a luz para aquela caverna e para eles, este homem é morto. Morto porque trouxe a luz, quis levá-los para outro patamar de existência.

Replicar modelos ineficientes, como o de acreditar em falsas imagens projetadas na parede, é sinônimo de alienação, como escrito anteriormente. Alienação é uma forma de acreditar em falsas imagens, em falsas sombras. Obviamente que não se podia exigir que aqueles habitantes tivessem alcance para desconfiarem daquelas sombras e, desta forma, questionarem.

Portanto, até aquele momento, a alienação deles estava explicada. Porém, a partir do momento que o outro habitante quis trazer a luz, por que recusá-la?

Assim fazemos. Tudo por conta da alienação, do medo de sair da caverna, desta falsa proteção que achamos que temos. É preciso desconstruir a forma como nos ensinaram a pensar. Pensar? Não sei se nos ensinaram a pensar ou se nos ensinaram a replicar modelos e regras. Assim fica mais fácil controlar e saber quem errou e, desta forma, puni-lo.

Fomos criados no sistema punição x recompensa. Já disse isto em algum outro texto.

Acertamos, somos recompensados. Erramos, somos punidos. Trata-se de um sistema que cria seguidores e não desbravadores. Trata-se de um sistema que faz o ser humano andar por caminhos já trilhados e construídos, e não a criar o seu caminho, a trilhar o seu andar. E a alienação está no caminho da punição x recompensa. Como fomos educados neste sistema, ali estamos alimentando a alienação. E quando nos desvinculamos, nos chamam de loucos.

E não foi o que fizeram com aquele habitante que conseguiu se desamarrar das correntes?

Seguir no caminho da alienação é perpetuar estereótipos ineficientes.  E o pior é que muitos deles estão se perpetuando e se renovando.  E por que isto?

Porque o comportamento é algo construído socialmente. Portanto, o lado bom disto é que muitas coisas boas serão exemplificadas e replicadas. Porém, os estereótipos ultrapassados também serão renovados por meio do nosso comportamento. E numa sociedade complexa como a nossa, a mudança de patamar é um desafio diário.

Penso que os tais gigantes sobre os quais Isaac Newton e Aristóteles se apoiaram tenham sido estas pessoas que ousaram sair da caverna. Estes desbravadores enxergaram longe e se desacorrentaram em busca da luz. O caminho deve ter sido árduo. Mas o que pode ser mais árduo que ficar condenado a olhar somente para uma parede, com imagens e sombras sendo projetadas o tempo todo? E o pior: acreditar nisto.

Quantas tradições, hábitos e crenças acabaram criando desavenças e guerras no mundo? As tais sombras nas paredes...

Nossa visão está ofuscada. E este ofuscamento é porque não queremos enxergar a luz. Temos dificuldades de assimilar outras posições, assumir que erramos, nos abrir a outros conhecimentos. Quando nos colocamos na posição de aprendizes, que é o que somos e o que sempre seremos, precisamos dizer uma frase mágica: “Eu não sei. Por favor, me ajude”. E como é difícil dizer “eu não sei” no mundo dos que acham que sabem, no mundo que não dá espaço para o “não saber”. Como é ilusório dizer que sabemos!

Para aqueles moradores da caverna tudo estava no lugar, tudo estava certo, tinham as respostas. Para que ir lá para fora? Bobagem...

As imagens projetadas na parede da caverna não poderiam ser sobrepostas ao que era verdadeiro. Mas foram e são assim ainda hoje. E convivemos com isto.

Estamos subindo cada vez mais os nossos muros, além das cercas elétricas. Isto só reforça a nossa alienação. O outro que não tem sequer a casa para ter muros, que dirá uma cerca elétrica, embrutecido, agride o dono da casa que tem muros.

Com estes muros tão altos, como vamos nos apoiar nos ombros dos gigantes?

Os gigantes vão lá na frente..., mas os muros altos nos impedem de vê-los.

Os meninos pobres e sem muros em suas casas, vulgarmente chamados de menores, brincam de carrinho de rolimã na rua porque querem, podem e também porque não têm acesso ao tablet e nem aos livros.

Os meninos ricos e com muros em suas casas, educadamente chamados de crianças, brincam nos seus tablets porque querem, podem e também porque não conhecem o carrinho de rolimã. Ah, mas eles têm livros...

A falência de nossos valores, a crença desmedida naquilo que não faz sentido. O ir com o fluxo sem perguntar para onde se vai. Isto é alienação. Isto é construir e fazer a sua morada numa caverna.

Meus avós dormiam de janelas e de portas abertas. Por que hoje uma tranca só não é suficiente? Nem a nossa impressão digital mais dá conta da segurança. A ordem agora é mapear a nossa corrente sanguínea. Aí sim ninguém poderá se passar por nós. Socorro!

É preciso saber quando a alienação passou dos limites. O limite é necessário para nos libertarmos das nossas cavernas.

Temos medo de mudar porque isto nos desequilibra. Mudar é desequilibrar. Andar para frente requer desequilíbrio momentâneo. Mas quem quer se desequilibrar no mundo em que o equilíbrio é uma constante para os vaidosos?

Atitude transformadora é para quem quer sair da caverna. Mas precisa ter coragem de enfrentar o que estiver lá fora. Caverna é para muitos. Sair da caverna é para poucos e para os gigantes que tiverem a coragem de crescer.

Por isto penso que sair da caverna é uma escolha. Difícil, mas certamente recompensadora. A escolha é nossa. Ninguém poderá fazê-la por nós. Mas penso que se ousarmos sair dela, voltar lá será obrigatório para resgatar ou, pelo menos, tentar resgatar quem ficou lá dentro.

Mas só conseguiremos fazer isto se nos apoiarmos sobre ombros de gigantes, como disse Isaac Newton ou Aristóteles, que viram isto tudo antes da gente porque ousaram sair, bem cedo, de suas cavernas.

segunda-feira, 13 de julho de 2015

Ei, McBarker...



Quem está aqui há algum tempo, certamente se lembra do Mr. Magoo: um velhinho simpático, “quase” cego e que vivia em confusão por conta disto. Sempre acompanhado de seu cão McBarker que ficava aflito quando via seu dono dirigindo na contramão. Uma das frases mais famosas do Mr. Magoo era: “Ei, McBarker...” e lá ia ele se meter em encrencas!

Como estou aqui há algum tempo, me lembrei com saudades deste desenho. E como era bom assisti-lo apenas como um desenho! Porque era isto o que ele representava para mim: apenas um desenho. Não era preciso pensar e nem refletir sobre coisa alguma.

A infância traz isto de bom: o riso frouxo, a inocência que nos isenta e nos protege do saber, e o descompromisso com a obrigatoriedade de olhar além, algo que a maturidade nos exige.

Esta inocência da infância, que nos convida apenas para viver e brincar, vai ficando distante na medida em que vamos amadurecendo e percebendo a complexidade das coisas, da vida e sobre esta necessidade de olhar além, enxergar o imperceptível, o óbvio. Olhar além é imprescindível se não quisermos ser atropelados pelos míopes de plantão.

A miopia só é engraçada na pele do Mr. Magoo, e ainda assim, apenas quando somos crianças.

Hoje, com a infância tendo se despedido de mim há algum tempo, descobri que o Mr. Magoo não era tão cego assim. Era uma estratégia dele para passar pela vida sem se aprofundar sobre as grandes questões. Sem responsabilidades. Ele era míope, claro, mas não cego como eu acreditava na minha infância. E mesmo esta miopia que ele tinha era discutível: em ocasiões que o interessavam, bem que ele enxergava. Mas como ele queria que os outros acreditassem que era cego ou, no mínimo, míope, assim ele fazia.

Quantos recados Mr. Magoo já nos dava naquela época. Mas não era possível percebê-los.

Um episódio clássico que me lembro é aquela cena de um grande fluxo de carros e ele, claro, dirigindo na contramão. Muitos carros bateram por causa disto, mas ele, que foi quem causou todo o transtorno, saiu ileso.

Rimos por causa do absurdo. Como alguém, dirigindo na contramão, pode se sair bem? Mr. Magoo conseguia. Mas na vida real, sabemos que não é bem assim.

Ele tinha sorte? Pode ser. Mas não era só isto. Existia uma crítica por trás daquele comportamento: a de não enxergar o que importava, a de delegar aquilo que não era possível, a de ser irresponsável, a de ser inconsequente. Coisas que a infância não nos permitiria enxergar, certamente.

Passada a infância, percebemos que o Mr. Magoo continua ativo, dentro e fora de nós.

Somos míopes em enxergar as nossas questões, mas enxergamos muitíssimo bem quando o assunto é apontar o dedo para o outro. Somos especialistas no assunto. Este é o Mr. Magoo de hoje. E acho que ele sempre existiu.

Quando apontam o dedo para nós nos sentimos injustiçados. Mas quando apontamos o dedo para o outro temos uma listinha de razões. Caso ele não concordar com o primeiro item da nossa lista, teremos o segundo, o terceiro...

A miopia nos faz orgulhosos, vaidosos, arrogantes. “Eu sei”. “Eu faço”. “Eu ganhei”. São tantos os “eus” que nem sei como não tropeçamos em nós próprios.

Somos míopes para o que realmente importa. Dá trabalho enxergar, dizer que viu. Quando dizemos que vimos, precisamos nos posicionar, opinar, descer do muro. Só que ficar sobre o muro é bem mais confortável que descer dele. Quando descemos, precisamos tomar partido, escolher um lado, o que, obviamente, implica abrir mão do outro. Isto, muitas vezes, pode se traduzir em desavenças, desentendimentos. Então é mais fácil dizer que não vimos. Pronto. Vamos nos escondendo na nossa miopia criada de forma tão conveniente. Criamos conveniências para atender a nossa vaidade. É este o nosso mundo.

Temos, claro, os que enxergam, e enxergam longe. Mas o mundo não é tão gentil com os que enxergam.

“Quem você pensa que é”? “Sabe com quem você está falando”? São perguntas clássicas dos míopes. E os que enxergam precisam, o tempo todo, respondê-las. Cansativas e exaustivas, mas precisam ser respondidas.

O míope é um limitador da linguagem. Acha que sempre tem resposta para tudo. Mas não tem. E nunca vai ter. Aliás nunca teremos. Eles querem, mas entre o querer e o poder, há uma longa distância. O míope quer saber tudo, quer ter tudo à mão, quer que façam por ele e para ele. Pobres míopes. Não querem o trabalho da construção, do processo, do caminhar. Têm dificuldades de enxergar além porque o seu umbigo está muito próximo dele. Acham que possuem as informações da vida, sabem a verdade. Eu sou... é a máxima do dicionário deles.

Manoel de Barros, um maravilhoso escritor que nos deixou há pouco tempo, dizia que quem acumula muita informação perde a oportunidade de adivinhar. E dizia, também, que precisamos nos tornar pessoas de conhecimento e não pessoas com informações. Por isto Manoel de Barros é considerado um dos imortais de nossa Literatura. Sabe das coisas.

A capacidade de adivinhação nos permite enxergar além, aquilo que falei que a maturidade nos exige diariamente. Mas isto ficou para trás porque estamos muito preocupados com o ter, com a posição, com o estatus.

Adivinhar é coisa de gente fraca. Eu tenho as respostas.

Tem uma frase que diz: “quando decorei todas as respostas, a vida mudou as perguntas. ” Pois é, ironias da vida. Não podemos perder o nosso prazer pela adivinhação, pela descoberta da vida. Caso contrário, ela vai mudar as perguntas. Estejamos certos.  Ela ensina de forma amarga, muitas vezes, mas quem mandou desprezarmos o açúcar?

O míope é aquele que não quer saber do contexto, e tira conclusões baseado apenas no texto. O míope está sempre apressado. Acha que nunca tem tempo. Está sempre correndo.

Você já conversou com algum míope? Você começa a falar e ele, sem pensar, te interrompe e conclui o que você estava tentando dizer. E aí você diz: “mas não era isto o que eu ia falar. ”

Ao passo que aquele que vê, que enxerga, tem tempo, tem espaço para o outro. Tem tempo porque sabe usá-lo e não vai na contramão dirigindo como louco atrapalhando os outros. Respeito e moderação são atributos dos que enxergam. Arrogância e prepotência são características dos que acham que enxergam.

Respeito e moderação trazem liberdade. Arrogância e prepotência trazem alienação. Prezamos tanto a liberdade, mas quando a temos em mãos, não sabemos o que fazer com ela. A liberdade nasce a partir da criticidade, da autenticidade, da autonomia. Mas como ser autônomo dirigindo na contramão?

Trabalhei numa Empresa que dizia que ela era o próprio benchmarking. Dizia que não existiam outras empresas que poderiam servir de benchmarking para ela. Participando de uma reunião, disse, para nós, o Diretor: “para quê fazer benchmarking? Somos o maior e o melhor benchmarking do mercado. Eles é quem deveriam aprender conosco e não o contrário. ” Enfim, acho que a miopia do Mr. Magoo passou por lá.

Com esta miopia latente, é melhor nem falarmos sobre ética. Aliás, o que é isto mesmo? Num mundo aonde a miopia aumenta consideravelmente, quem vai sair desta contramão?

Mas a conta da miopia chega para todos. E não vai dar para parcelar o débito.

Em outra reunião, na mesma Empresa, ouvi a seguinte colocação: “errem dentro da política, mas não acertem fora dela. ” Socorro! Quanta miopia e arrogância!

As regras e as políticas são necessárias, porém desde que façam sentido.  Dizer para errar, porém dentro de uma regra, mas jamais acertar fora dela é assassinar qualquer poder de iniciativa que pudesse nascer ali. Se alguém, naquela reunião, tivesse alguma ideia para dar, certamente ficaria calado. E foi o que aconteceu. Enfim, Mr. Magoo fez escola...

A miopia é uma forma de nos colocar como vítima diante à vida. Somos vítimas de nossa própria falta de limites e de educação. Somos nossos próprios reféns.

Somos míopes para enxergar o que deveria ser visto. O míope tem dificuldade de enxergar de longe porque não sabe lidar nem com o que está próximo dele.

Temos uma relação difícil entre o desejo pelo poder e o não direito a este poder que achamos que temos.

Esta miopia está nos tirando a esperança de acharmos uma solução. E isto está nos tornando insensíveis e frios. A dor do outro não me dói mais. Não sei se um dia chegou a doer, mas o fato é que a miopia está aumentando.

Nossas emoções estão míopes porque só queremos as boas emoções. As más e as difíceis, medicalizamos. Deixa que o remédio dê conta disto.

Estamos, como o Mr. Magoo, andando na contramão de coisas importantes. Mas lá era só um desenho, aqui não. Lá era engraçado, aqui não.

A miopia é exatamente esta deficiência de se enxergar além, ir adiante, mais longe.

A conveniência de ser míope: “puxa, não vi, me desculpe”. A miopia te camufla, te protege.

Medir o outro pela sua régua é um grande sinal de cegueira, de miopia. Os míopes enxergam as diferenças como divergências. E isto é andar na contramão da vida. É atropelar o outro. É não deixar o outro falar.

A miopia se dá quando nos escondemos na submissão, quando não assumimos a nossa posição, quando temos medo de dar a nossa opinião.

A miopia se dá quando fazemos de conta que não sabemos, nos escondemos em medos que criamos só para nos fazer de fracos e alguém ficar com pena da gente.

Vi uma criança de não mais de 07 anos vender limão no farol. Isto acontece ao mesmo tempo que algum marmanjo ganha algum dos auxílios do governo. Isto me faz entender o porquê este menino precisa vender limão no farol.

Os auxílios financeiros são importantes desde que sejam pontuais, e não como uma forma de sustento fixo para quem pode e deve se sustentar.

Ajuda não pode ser confundida com assistencialismo. Uma coisa é ajudar; outra coisa é sustentar. Uma coisa é dar condições para. Outra coisa é fazer pelo outro. Agora entendo porque o menino de 07 anos vende limão no farol e mais de 140 milhões de adolescentes estão fora da escola, no mundo. A miopia do Mr. Magoo já sinalizava estas coisas, mas era preciso entendê-las. Os desenhos animados, de ingênuos, não têm nada.

Miopia é esta dissociação, este paradoxo do outro. O outro está sempre errado, o preconceito é sempre do outro. Queremos ser aceitos. Então fazemos de tudo para tal, mesmo que isto custe a nossa dignidade.

Precisamos sair de nós e olhar de um ponto de vista neutro para que possamos amadurecer. Mas quem se habilita?

O míope não quer ver o contexto, não quer saber do todo. Diz que não tem tempo.

Quem vê quer saber do contexto, quer saber do todo. Sempre tem tempo.

O míope enxerga a conveniência. O que vê enxerga a totalidade.

O míope enxerga o micro. O que vê enxerga o macro.

O míope quer a resposta. O que vê faz sempre perguntas.

Penso que os míopes tenham sido elogiados demais na infância. Muitos elogios nos fazem perder a medida das coisas, nos fazem perder o tamanho de quem realmente somos, nos tiram da realidade. Por isto nos tornamos míopes: queremos ser maiores do que verdadeiramente somos. O elogio em excesso nos faz olhar somente para nós e deixar de olhar para o outro. Quando olhamos para o outro e enxergamos nele habilidades diferentes das nossas, isto vai nos trazendo medidas para a vida. Mas com tantos elogios, como enxergar estas medidas e estas habilidades diferentes no outro, que nós não temos? Por isto somos míopes.

E o que pode nos tirar desta miopia?

Sabemos que não há receita, não estamos fazendo um bolo. Portanto não é simples. Mas acredito que um caminho que se desenha é trabalhar a nossa autoestima, construirmos e desenvolvermos a nossa autonomia como seres humanos. Desta forma, reduziríamos os nossos níveis de narcisismo uma vez que não estaríamos mais no pedestal da vida. É preciso conhecer as nossas medidas, conhecer as medidas da vida. Elas existem, apesar de insistirmos em não as conhecer. Aquele que quer tudo somente para si é um narcisista, e isto traz um distanciamento do que realmente importa. Se o narcisista não consegue toda a admiração de que precisa ele se torna agressivo quando criticado e rejeitado.

Quando olharmos para as necessidades do outro a nossa miopia começará a dar lugar à claridade, à lucidez.

Num mundo que valoriza a miopia em vários aspectos, realmente é difícil enxergar o que ninguém vê. Enxergar além. Vão tentar nos impedir a todo custo. “Tolo”, dirão para nós. Mas é fundamental, se quisermos dar um passo além.

Como disse Isaac Newton:

“Construímos muros demais e pontes de menos. ”

Talvez seja este o principal motivo de nossa miopia.

domingo, 5 de julho de 2015

As pessoas vão e vêm

As pessoas vão

As pessoas vêm

Vão a todos os lugares. Vêm nem sempre de todos eles

Vão porque precisam. Vão porque querem

Vêm porque não querem. Vêm porque alguém mandou

Vão para fazer

Vêm para saber

Vão para obedecer

Vêm para entristecer

Vão para começar

Vêm para esquecer

Tem gente que vem para que o outro chegue. Tem gente que sai para que alguém entre

Tem gente que dá passagem; tem gente que emperra a passagem. Tem gente que finge dormir para fazer “de conta” que não viu

Mas alguém avisou que o faz-de-conta é só para os livros e memórias de Emília?

Tem gente que sai, tranca a porta e leva a chave. Mas tem gente que deixa a chave embaixo do tapete

Tem gente que quer que você entre. Tem gente que finge não estar em casa

Outros chegam porque outros foram embora. Às vezes em boa hora; às vezes, não

Talvez os que foram não deveriam ter ido. Tem espaço para todos. Será?

A pergunta sem resposta; a resposta sem pergunta. A pergunta que não terá resposta. E a resposta que precisa de perguntas certas. E qual é a pergunta certa? Será que ela existe?

O movimento paralisa. O excesso nos priva do pensar

As pessoas acordam enquanto outras dormem

As pessoas estudam enquanto outras tentam sobreviver

Tem gente que aprendeu a escrever o nome bem tarde; tem gente que nunca aprenderá

Tem gente que ajuda a significar. Tem gente que só atrapalha

Acordar para poder levantar. Deitar para acordar

Tem gente que não sai e, portanto, o outro não consegue entrar

Tem gente que não sai porque acha que o lugar é dele. Mas ele ainda não se achou nem dentro dele

Tem gente que grita para esconder o medo da sua insignificância

Tem gente que fala manso e sua mansidão ganha significado longe

O movimento paralisa. A inércia faz pensar. O falar às vezes é inoportuno. O silêncio é uma oração. A ferrugem denuncia a ausência

O silêncio é ausente nos dicionários da arrogância

Tem gente que fala quando deveria se calar

Tem gente que silencia quando deveria falar

As pessoas vão e vêm

O barulho dos passos ensurdece o som dos pássaros. Mas quem os ouve?

Porque as pessoas vão e vêm, os pássaros vão precisar esperar. Mas eles sabem. A gente não

As pessoas vão e vêm como figurantes pela vida: o figurante não fala

O barulho dos pensamentos das pessoas é interrompido pela pressa das buzinas

A vontade dos pensamentos das pessoas é interrompida por mais uma meta a ser cumprida

As buzinas fazem vozes e escondem a tristeza que vai dentro de cada um

A pressa das pessoas é um santo remédio para esconder a tristeza

A tristeza resgata a gente para o nosso íntimo: um lugar que há tempos não passamos. Onde fica o nosso íntimo, mesmo?

A inteligência tem reclamado seu estado de burrice frente à forte obediência

As pessoas vão para aparecer

As pessoas vão para desaparecer

A figuração pela vida é um reflexo da toalha que jogamos no chão e deixamos que o outro ganhasse a parada

As pessoas vão para destratar

As pessoas vêm para retratar

O destrato é a arte do descaso

Descaso para com a vida

A vida. A minha, a sua a nossa vida. Uma vida que está sofrendo uma medicalização porque queremos controlar, com químicas, os nossos sentimentos e as nossas dores

Nem os sentimentos e dores ganham espaço neste ir e vir

Estamos com pressa

Não dá tempo de sofrer

Não dá tempo de ficar triste

Não podemos parar a máquina das vaidades

Bendito seja o remédio que esconde o que o nosso íntimo tenta nos mostrar

Por isso as pessoas vão e vêm

Para não verem as dores e nem os sentimentos seus, que dirá os alheios

O remédio sendo feito de Deus: tomo e espero a cura

As pessoas vão e vêm

As pessoas vão para ajudar

As pessoas vão para atrapalhar

As pessoas vão e vêm sem saber para onde estão indo e nem onde estão chegando

As pessoas vão e vêm

Vão para entender a fundo e o fundo das coisas

Vêm para ficar no raso: a superfície é sempre mais segura. O que me perguntarem ali, vou saber responder

A mulher oprimida pela educação. O homem oprimido pela obrigação

As pedras menores que há no caminho não podem ser retiradas porque alguém as eternizou

As pedras maiores que há no caminho podem ser retiradas, mas alguém não viu porque as pequenas impedem a visão das maiores

Tem gente que caminha em círculos e nem sabe

Tem gente que anda bem, mas somente sozinho

Tem gente que está perguntando, ainda, qual é o caminho

Tem gente que aprendeu faz tempo e já está fazendo pontes para outros

Tem gente que anda bem no caminho que o outro trilhou

Tem gente que se perdeu faz tempo, e não sei se vai se achar. Talvez ele se ache se recolher a toalha que ele mesmo lançou no chão

Tem gente que tem o que dizer, mas ninguém pergunta e nem quer ouvir

Tem gente que não tem o que dizer, mas há muitos perguntando o que ele acha, somente para servir de alimento para a vaidade e presunção de alguns tantos que acreditam nisto. Coitados!

As pessoas vão e vêm

Para aonde vão? Não sei se elas sabem

O sinal tocou. Alguém tocou este sinal. Portanto é preciso entrar

Mas o aprendizado se dá sem toques de sinais. Mas é preciso entrar porque alguém mandou

E é este alguém que certamente faz parte daquele grupo de pessoas que vão e que vêm