terça-feira, 20 de junho de 2017

Nossas escolhas nos revelam

imagem tirada da internet

imagem tirada da internet

As duas imagens falam por si. As palavras que escreverei aqui serão coadjuvantes. A imagem e, principalmente, a mensagem, já foram ditas. Um olhar atento às fotos para não precisarmos de uma palavra sequer.

A primeira imagem é da menina Rivânia, oito anos, moradora de uma cidade do interior de Pernambuco. Na semana passada, durante uma enchente, a avó dela pediu para ela buscar um abrigo, se proteger e tentar salvar o que fosse o mais importante. A menina, então, no auge da maturidade dos seus oito anos, salvou a mochila que leva à escola, com os livros e materiais de estudo.

A segunda imagem, uma pessoa corre com uma mala recheada de dinheiro. Uma cena que nos é familiar, infelizmente. Há poucas semanas, um certo deputado foi visto saindo de uma pizzaria, em São Paulo, correndo com uma mala cheia de dinheiro, fruto de propina e de roubo. Dentro da mala, R$ 500 mil, dinheiro suficiente para comprar muitos livros para várias Rivânias que existem no Brasil e no mundo.

Duas imagens fortes, mas com sentidos opostos. Duas malas, mas com conteúdos distintos.

Nossas escolhas nos revelam. Nossas escolhas dizem o que carregamos dentro de nossas mochilas. Nossas escolhas nos conduzem pela vida. Nossas escolhas nos reduzem ou aumentam o nosso tamanho.

Existe um pensamento que diz que “para se conhecer alguém, de verdade, é preciso dar dinheiro e poder a este alguém. ” Concordo. Acredito. Mas acho que além de poder e de dinheiro, ferramentas que nos permitem conhecer alguém, há uma outra ferramenta tão poderosa quanto: o desespero. Em situações desesperadoras ou quando nos sentimos acuados, nosso melhor e nosso pior ângulo se mostram. E também nesta hora somos revelados.

As duas cenas acima mostram isto. São situações extremas de desespero e de medo. Quando nos encontramos nestes momentos, quem somos, verdadeiramente, surge e se confirma. Nossos valores são colocados à prova, à mostra e evidenciamos a nossa força ou a nossa fraqueza, a nossa moral ou a nossa imoralidade. A nossa ética ou a nossa completa falta de escrúpulos.

O que escolhermos fazer, será o resultado de nossa caminhada até aqui.

O poder e o dinheiro: duas forças que constroem e que destroem. As duas coisas juntas. Ora uma, ora outra. Ou uma ou outra. O conteúdo de nossas mochilas determinará esta resposta.

O desespero e o medo: duas forças que escondem e que revelam. E o que colocamos na mochila será determinante para localizarmos os esconderijos aonde escondemos aquilo que não queremos que seja revelado.

Na primeira cena, uma completude. Apesar da tristeza da cena acinzentada, a postura decidida e consciente de Rivânia, segurando a mochila da escola, não nos deixa margem a dúvidas. Os seus oito anos de idade são suficientes para ela saber o que fazer aqui. Esta menina é uma prova de que maturidade independe de idade, mas sim de condição moral.

Na segunda cena, uma incompletude. Uma valorização do vazio, do insosso, daquilo que não tem importância, do excesso, do supérfluo. Um não-querer ouvir a própria fraqueza porque a fala se tornou intolerante e impiedosa. Um passo dado maior que a perna. Um desprezo ao silêncio que diz muito, mas que não é ouvido. Muitas das nossas dificuldades resultam da nossa incompletude, da nossa imperfeição.

Na primeira cena, o comportamento que traduz o que se busca; na segunda, um comportamento construído em bases de mentiras cuidadosamente selecionadas, muitas vezes, no começo da vida e nos valores que a família não possuía. Então, como transmiti-los?

O mal é barulhento. O bem é silencioso. O homem que corre com a mala cheia de dinheiro tem o passo apressado que produz barulho. A menina silencia, no barco, agarrada a sua mochila.

O mal que aparece porque é indiscreto e desnecessário. O bem que não aparece porque silencia e é omisso, muitas vezes. Uma omissão que surge porque acreditamos numa coerência e numa racionalidade inexistentes. Uma omissão que nos leva à submissão.

Por que não descontruir comportamentos falidos para entender a raiz do insucesso? Porque isto seria aceitar o insucesso e a nossa completa falta de jeito para muitas coisas. Seria aceitar que erramos e que é preciso refazer o caminho, mesmo que isto custe e demore muito tempo.

Ensinaram-nos a pensar. Mas será que nos ensinaram da forma correta? É preciso trilhar caminhos pisados para conhecermos melhor o significado das nossas pisadas. Somente assim, acredito, saberemos o conteúdo, ao certo, de nossas mochilas. Sem sustos, sem medos.

Na mala com dinheiro, uma banalização da vida, um acesso fácil àquilo que não é nosso, um encurtamento de caminho que jamais poderia ter sido diminuído, um roubo de nossas memórias, de nossa moral, de nossa ética. Uma exposição do lixo que esgota a bilheteria. Todos querem ver. Uma amostra, a céu aberto, de nossas baixas medidas e de nossa régua em nossos pés, demonstrando que ainda mal começamos a caminhar. Uma caminhada que, certamente, fará doer muito, e muito, os nossos pés, caso queiramos voltar para a trilha, se é que um dia estivemos nela. Mas ela existe. Tudo é uma questão de crença.

Na mochila da escola, um abraço de valorização da vida. Do saber o que se quer. Do entendimento sobre o que se faz aqui. Uma sensibilidade que não se ensina, se sente. Uma combinação do certo. Uma imagem que dispensa porquês. Uma imagem que emociona devido à profundidade do seu significado.

Quero encerrar este texto, mas não a reflexão, com um pensamento de Monteiro Lobato, um escritor que também dispensa porquês, que diz:

“Um País se faz com homens e livros. ”

A Rivânia já entendeu isto, literalmente. A imagem dela, naquela canoa, não nos deixa dúvidas de que ela abraçou o que, verdadeiramente, importa.

Que possamos encontrar mais Rivânias pelo mundo, mostrando, orgulhosamente, o conteúdo do que carregam nas mochilas. Que possamos abraçar, além dos livros, propriamente ditos, mais certezas do certo, do justo, do ético. Que possamos abraçar o que, de verdade, for importante para nós, o que contribuir para que possamos ser melhores em todos os sentidos.

E que nossas mochilas, após se acostumarem a carregar o que, de verdade, importa, possam se engrandecer e aumentar de tamanho para carregarem, cada vez mais, conteúdos que revelem nossas sábias escolhas.

O que vai, portanto, dentro da sua mochila?

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