imagem tirada da internet
imagem tirada da internet
As
duas imagens falam por si. As palavras que escreverei aqui serão coadjuvantes.
A imagem e, principalmente, a mensagem, já foram ditas. Um olhar atento às
fotos para não precisarmos de uma palavra sequer.
A primeira
imagem é da menina Rivânia, oito anos, moradora de uma cidade do interior de
Pernambuco. Na semana passada, durante uma enchente, a avó dela pediu para ela
buscar um abrigo, se proteger e tentar salvar o que fosse o mais importante. A
menina, então, no auge da maturidade dos seus oito anos, salvou a mochila que
leva à escola, com os livros e materiais de estudo.
A
segunda imagem, uma pessoa corre com uma mala recheada de dinheiro. Uma cena
que nos é familiar, infelizmente. Há poucas semanas, um certo deputado foi
visto saindo de uma pizzaria, em São Paulo, correndo com uma mala cheia de
dinheiro, fruto de propina e de roubo. Dentro da mala, R$ 500 mil, dinheiro
suficiente para comprar muitos livros para várias Rivânias que existem no
Brasil e no mundo.
Duas
imagens fortes, mas com sentidos opostos. Duas malas, mas com conteúdos
distintos.
Nossas escolhas nos revelam. Nossas
escolhas dizem o que carregamos dentro de nossas mochilas. Nossas escolhas nos
conduzem pela vida. Nossas escolhas nos reduzem ou aumentam o nosso tamanho.
Existe um pensamento que diz que
“para se conhecer alguém, de verdade, é preciso dar dinheiro e poder a este alguém.
” Concordo. Acredito. Mas acho que além de poder e de dinheiro, ferramentas que
nos permitem conhecer alguém, há uma outra ferramenta tão poderosa quanto: o
desespero. Em situações desesperadoras ou quando nos sentimos acuados, nosso
melhor e nosso pior ângulo se mostram. E também nesta hora somos revelados.
As duas cenas acima mostram isto.
São situações extremas de desespero e de medo. Quando nos encontramos nestes
momentos, quem somos, verdadeiramente, surge e se confirma. Nossos valores são
colocados à prova, à mostra e evidenciamos a nossa força ou a nossa fraqueza, a
nossa moral ou a nossa imoralidade. A nossa ética ou a nossa completa falta de
escrúpulos.
O que escolhermos fazer, será o resultado de nossa caminhada até aqui.
O poder e o dinheiro: duas forças que constroem e que destroem. As
duas coisas juntas. Ora uma, ora outra. Ou uma ou outra. O conteúdo de nossas
mochilas determinará esta resposta.
O desespero e o medo: duas forças que escondem e que revelam. E o
que colocamos na mochila será determinante para localizarmos os esconderijos
aonde escondemos aquilo que não queremos que seja revelado.
Na primeira cena, uma completude.
Apesar da tristeza da cena acinzentada, a postura decidida e consciente de
Rivânia, segurando a mochila da escola, não nos deixa margem a dúvidas. Os seus
oito anos de idade são suficientes para ela saber o que fazer aqui. Esta menina
é uma prova de que maturidade independe de idade, mas sim de condição moral.
Na segunda cena, uma
incompletude. Uma valorização do vazio, do insosso, daquilo que não tem
importância, do excesso, do supérfluo. Um não-querer ouvir a própria fraqueza
porque a fala se tornou intolerante e impiedosa. Um passo dado maior que a
perna. Um desprezo ao silêncio que diz muito, mas que não é ouvido. Muitas das
nossas dificuldades resultam da nossa incompletude, da nossa imperfeição.
Na primeira cena, o comportamento
que traduz o que se busca; na segunda, um comportamento construído em bases de
mentiras cuidadosamente selecionadas, muitas vezes, no começo da vida e nos
valores que a família não possuía. Então, como transmiti-los?
O mal é barulhento. O bem é
silencioso. O homem que corre com a mala cheia de dinheiro tem o passo
apressado que produz barulho. A menina silencia, no barco, agarrada a sua
mochila.
O mal que aparece porque é
indiscreto e desnecessário. O bem que não aparece porque silencia e é omisso,
muitas vezes. Uma omissão que surge porque acreditamos numa coerência e numa
racionalidade inexistentes. Uma omissão que nos leva à submissão.
Por que não descontruir
comportamentos falidos para entender a raiz do insucesso? Porque isto seria
aceitar o insucesso e a nossa completa falta de jeito para muitas coisas. Seria
aceitar que erramos e que é preciso refazer o caminho, mesmo que isto custe e
demore muito tempo.
Ensinaram-nos a pensar. Mas será
que nos ensinaram da forma correta? É preciso trilhar caminhos pisados para
conhecermos melhor o significado das nossas pisadas. Somente assim, acredito,
saberemos o conteúdo, ao certo, de nossas mochilas. Sem sustos, sem medos.
Na mala com dinheiro, uma banalização
da vida, um acesso fácil àquilo que não é nosso, um encurtamento de caminho que
jamais poderia ter sido diminuído, um roubo de nossas memórias, de nossa moral,
de nossa ética. Uma exposição do lixo que esgota a bilheteria. Todos querem
ver. Uma amostra, a céu aberto, de nossas baixas medidas e de nossa régua em
nossos pés, demonstrando que ainda mal começamos a caminhar. Uma caminhada que,
certamente, fará doer muito, e muito, os nossos pés, caso queiramos voltar para
a trilha, se é que um dia estivemos nela. Mas ela existe. Tudo é uma questão de
crença.
Na mochila da escola, um abraço
de valorização da vida. Do saber o que se quer. Do entendimento sobre o que se
faz aqui. Uma sensibilidade que não se ensina, se sente. Uma combinação do
certo. Uma imagem que dispensa porquês. Uma imagem que emociona devido à profundidade
do seu significado.
Quero encerrar este texto, mas
não a reflexão, com um pensamento de Monteiro Lobato, um escritor que também
dispensa porquês, que diz:
“Um País se faz com homens e livros.
”
A Rivânia já entendeu isto,
literalmente. A imagem dela, naquela canoa, não nos deixa dúvidas de que ela
abraçou o que, verdadeiramente, importa.
Que possamos encontrar mais
Rivânias pelo mundo, mostrando, orgulhosamente, o conteúdo do que carregam nas
mochilas. Que possamos abraçar, além dos livros, propriamente ditos, mais
certezas do certo, do justo, do ético. Que possamos abraçar o que, de verdade,
for importante para nós, o que contribuir para que possamos ser melhores em
todos os sentidos.
E que nossas mochilas, após se
acostumarem a carregar o que, de verdade,
importa, possam se engrandecer e aumentar de tamanho para carregarem, cada vez
mais, conteúdos que revelem nossas sábias escolhas.
O que vai, portanto, dentro da
sua mochila?
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