imagem tirada da internet
Diz
a história que um milionário promoveu uma festa em uma de suas mansões. Num determinado
momento, ele pediu para baixar o som para poder falar com os convidados. Ao
lado da piscina, aonde criava crocodilos,
ele disse:
-
Quem pular na piscina e conseguir atravessá-la até o outro lado ganhará todos
os meus carros. Alguém se habilita?
Espantados,
os convidados ficaram em silêncio. E o milionário insistiu:
-
Quem pular na piscina e conseguir atravessá-la até o outro lado ganhará todos
os meus carros e os meus aviões. Alguém se habilita?
O
silêncio foi desconcertante.
Mais
uma vez, então, o milionário disse:
-
Quem pular na piscina e conseguir atravessá-la até o outro lado ganhará todos
os meus carros, os meus aviões e as minhas mansões.
Foi
neste momento que alguém saltou na piscina. A cena era impressionante. Uma
intensa luta. O rapaz que saltou na piscina se defendia como podia. Segurava a boca
dos crocodilos com pés e mãos. Tentava torcer o rabo dos animais. Muita
violência e emoção. Após alguns minutos de terror e de pânico, o corajoso
homem, cheio de feridas, saiu da piscina. Vivo.
O
milionário se aproximou dele, o parabenizou e perguntou:
-
Aonde você deseja que os meus carros sejam entregues?
-
Obrigado, mas não quero os seus carros, respondeu o rapaz.
Surpreso,
o milionário perguntou:
-
Então você aceita os meus aviões? Aonde posso entregá-los?
-
Obrigado, mas também não quero os seus aviões.
Estranhando
a reação do homem, o milionário fez mais uma pergunta:
-
E as minhas mansões? Agora elas pertencem a você!
-
Eu tenho uma bela casa, não preciso das suas, respondeu o rapaz.
Impressionado,
o milionário perguntou:
-
Mas se você não quer nada do que ofereci, o que quer então?
-
Apenas encontrar o imbecil que me
empurrou para dentro da piscina!
Humor
à parte, ninguém, em sã consciência, se atiraria, literalmente, numa piscina
com crocodilos. A aparência amiga que a imagem deste texto sugere está presente
só nos desenhos. Na vida, queremos ficar longe deles, mas nem sempre é
possível.
Sempre
escrevo que são várias leituras que podem ser feitas a partir de um texto. E
com este não poderia ser diferente. Toda e qualquer leitura que fazemos sempre
trará a verdade de cada um.
Lendo
esta história, me lembrei das piscinas com crocodilos pelas quais já passei, e
com as quais fui convidada a lidar e
a mergulhar. O convite, muitas vezes, vinha mascarado de oportunidade na fala
de um mau gestor, no erro por escolhas mal pensadas, no comportamento dos
hipócritas, no discurso pronto e hostil e aquele comprado por pessoas que não faziam
da ética, a sua primeira opção de vida. Piscinas não me faltaram. Algumas
fundas, que me ensinaram a nadar, e outras rasas que, apesar de eu não ter o
problema da profundidade, outros crocodilos eram colocados lá a todo momento. O
convite vinha por todos os lados.
Nunca
entramos, por querer, em piscinas com crocodilos. No máximo, sabemos que
estamos entrando num lugar com animais ferozes, mas o nosso otimismo natural
sempre nos faz crer que o bicho “não é tão feio assim como pintam”. E aí,
esperançosos, colocamos parte dos nossos pés na água, e quando nos damos conta,
o crocodilo já está atrás de nós. Na maioria das vezes, o que ocorre,
exatamente como na história, somos convidados
a dar um mergulho numa piscina com integrantes bem acessíveis e generosos.
Entrar em piscinas com crocodilos não depende apenas de nós.
Permanecer nelas, sim.
Os
crocodilos, apesar de sua aparência repugnante e do perigo que representam, nos
fazem um serviço que anos de estudos não seriam suficientes: eles nos fazem,
como na história, lutar como guerreiros, desejar a nossa sobrevivência, descobrir
o nosso lado estrategista, planejar, confiar, desenvolver o foco e a atenção,
ter um objetivo e persegui-lo.
Com um crocodilo atrás da gente, o tempo e a vida são mais
valorizados.
Eles
nos elevam a um patamar de excelência que levaríamos anos para descobrir e para
colocar em prática.
Na
história, mesmo à força, aquele homem descobriu que “o outro lado da piscina” é
para todos, inclusive para ele. Que chegar “do lado de lá” dependia, entre
outras coisas, dele.
Metáforas
e proporções à parte, estarmos mergulhados numa piscina com crocodilos é
sinônimo de testar nossas forças, de não desistir e de, acima de tudo, rever
planos e objetivos. Os crocodilos são excelentes anfitriões. Eles não nos dão
muito tempo para firulas. Forçam-nos a nos enxergar dentro da piscina e saber
quem somos. Estar lá é um convite para saber se o rumo tomado está certo.
Os crocodilos sempre indicam caminhos. É preciso saber
reconhecê-los e trilhá-los.
Eles
sempre foram presentes em nossas vidas. Como são quietos e lentos não
percebemos a sua presença. Mas eles estão lá.
Com
ou sem o nosso consentimento, eles têm vida própria e sempre nos visitam ao
longo de nossas vidas, e de formas variadas. Eles chegam, se acomodam e ainda
nos pedem um café, porque não têm hora para irem. Mas quando eles se vão, nos
agigantamos. Olhamos para trás, para a piscina na qual estávamos mergulhados e,
de forma irônica, agradecemos aos crocodilos pela visita, até então
incompreendidos por nós. Reconhecemo-nos vivos e munidos de ferramentas até
então desconhecidas por nós. Ferramentas nos dadas por eles.
Ferramentas que descobrimos ao longo de nossa jornada até o outro
lado da piscina. Ferramentas que descobrimos enquanto lutávamos com os
crocodilos.
Eles
existem para despertar a força que há em nós, cuja capacidade não tivemos para fazê-la.
Mas eles tiveram e fizeram o trabalho por nós. Os crocodilos são ágeis e
atentos.
Dentro
de uma piscina com crocodilos, o “não posso” não existe, mas sim o “como”.
Somente isto nos fará sobreviver a eles. O como
abre caminhos para o outro lado da piscina; o não posso nos faz ser engolidos.
Enquanto
nadamos até o outro lado, o crocodilo vai nos obrigando a descortinar nossos
saberes. É uma questão de sobrevivência. Não temos saídas e opções. E a medida
que avançamos e chegamos do outro lado, o crocodilo vai se despedindo de nós.
Vencer é uma questão de escolha e de criar possibilidades.
Sem
eles, poderíamos ter ficado pelo caminho. Muitos de nós, por não terem tido
crocodilos em suas vidas, viveram às margens da paisagem vista da janela. Mas
os que tiveram a grande sorte de terem sido jogados dentro de piscinas com
crocodilos, hoje ajudam a pintar a paisagem, e não apenas a contemplam.
Portanto,
gratidão aos crocodilos do caminho, antes que os convites para novos mergulhos
cheguem a nós.
Quero
encerrar este texto, mas não a reflexão, com um pensamento de Horácio, Filósofo
e Poeta da Roma Antiga, que diz:
“A
adversidade desperta em nós capacidades que, em circunstâncias favoráveis,
teriam ficado adormecidas. ”
Bendito
sejam os crocodilos do caminho.