Há muitas perguntas subjetivas na
vida, e esta é uma delas. O que é dar
certo? Não há uma resposta a esta pergunta. Não há receitas e fórmulas.
Quem souber e tiver uma resposta pronta para esta questão, certamente está mal
informado.
Gente com fórmulas e receitas
prontas para questões complexas e, acima de tudo, subjetivas, não está
preocupado em viver, em saborear a vida, em apreciar cada momento aqui, em se
aprimorar e servir, mas sim na rapidez para aparecer, no entregar algo, mesmo
que este algo seja completamente sem sentido. A preocupação está em
corresponder às expectativas, mesmo que não saibamos quais são elas e para que
servem.
No entanto, me parece que isto
não corresponde ao que pensam aqueles jovens que realizaram uma festa à
fantasia, num colégio no estado do Rio Grande do Sul, há algumas semanas. Sob o
tema, “se nada der certo”, estes pobres
alunos se fantasiaram de vendedores ambulantes, faxineiros, funcionários do Mc Donald´s, pedintes, moradores de rua,
cozinheiros, atendentes do Grupo Carrefour.
E o mais emblemático: alguns se fantasiaram de ladrão.
imagens tiradas da internet
Triste
ver o racismo e o preconceito passeando livremente, sem qualquer tipo de
retaliação, ocorrendo em um ambiente cujo conteúdo abordado deveria, por
motivos óbvios, ser outro.
Esta
festa ocorreu em dois colégios do Sul. E como sabemos que coincidências não
existem, os dois colégios são frequentados por alunos de alta renda. O que isto nos traz de reflexões? Muitas coisas. E a
primeira delas, é que, certamente, a maioria, senão todos, tem a sua mensalidade
paga pelos pais. Estes alunos desconhecem, certamente, os bastidores
necessários para que este tipo de mensalidade seja sustentada. Isso para dizer
o mínimo.
Obviamente
não podemos generalizar. Nem todos os colégios de alta renda realizam este tipo
de aberração. Mas, infelizmente, o dinheiro e o poder deturpam e revelam a face
dos que não conhecem a ética e o escrúpulo. E foi o que aconteceu nestas duas escolas
cujos nomes deveriam ser divulgados como exemplos de desserviços prestados à
sociedade.
São exemplos tristes e de uma pobreza
inquestionável que sempre devem ser lembrados como modelos educacionais a não
serem seguidos.
Após
uma repercussão péssima socialmente, alguns pais de alunos e profissionais destas
duas escolas desculparam-se em público, dizendo que isto não mais se repetirá. Um
pouco tarde, ou não? E muito conveniente pedir desculpas depois que todos
perceberam.
Para
aqueles que colocam o dinheiro, o poder e o estatus em patamares questionáveis
e inalcançáveis, dar certo é sinônimo destas conquistas materiais. E se não
atingirem este patamar, não terão dado certo. E a consequência disto?
Tornarem-se varredores de rua, por exemplo, na opinião deles.
O
que estes alunos ainda não entenderam, se é que um dia entenderão, é que agir
da forma como eles agiram e pensar da forma como pensam, isto sim é não dar
certo. São pobres cegos no caminho, perdidos em busca de algo para alimentar o
ego construído em falsas bases. E quando descobrirem isto, poderá ser tarde
demais. Muito tempo terá sido perdido e desperdiçado.
Estes
alunos estão construindo um passado por meio deste tipo de atitude. Passado que
no futuro será cobrado. Lá na frente, quando olharem para trás, encontrarão,
sim, o passado deles, mas serão passados que não terão traduzido uma vida plena
de sentido. O passado destes pobres aspirantes a seres humanos traduzirá formas
tortas, imprecisas, ininteligíveis, inacessíveis. Uma visão triste do que se
transformaram devido à busca pela incoerência.
Quando
olharem a si próprios, num futuro incerto, verão insignificância em seus
espelhos de ouro e de luxo. Serão prisioneiros do externo, do supérfluo, das
aparências, do dinheiro. Uma prisão que até terá as portas abertas, mas como eles
estarão com suas máscaras tão presas ao rosto, como disse Fernando Pessoa, não
enxergarão a saída das prisões. E lá permanecerão.
Dar
certo não há fórmulas, mas caminhos que não o trilhado por estes pobres jovens
que já estão e são perdidos, ainda no começo da vida. Uma vida desperdiçada nos
disfarces, naquilo que não importa, no desrespeito, no racismo e no preconceito.
Isto, sim, é não dar certo.
O mote da festa, em si, estava
representado naqueles tristes jovens. Os arrogantes de agora e do futuro.
Pessoas cegas que dispensam guias por os considerarem desnecessários. Mas que
tropeçam em pequenos obstáculos pela mais pura falta de jeito e de cuidado com
tudo o que cerca a vida, a vida de verdade, e não esta que eles vivem.
Uma
triste realidade que possui cúmplices: pais, educadores, escola, Estado etc.
Mas que somente se pronunciaram após barulhos nas redes sociais e na sociedade,
em si. Barulhos?
Até
quando vamos agir apenas porque alguém gritou e reclamou? Por que temos tamanha
dificuldade de ouvir os silêncios? Silêncios que constroem, que marcam, que
edificam e que deixam marcas sólidas e verdadeiras.
Apesar
da pouca idade, mas o suficiente para saberem o que fazem, estes pobres jovens
encontram-se embrutecidos, cegos e alheios às necessidades do outro, mostradas,
todos os dias, pelas janelas das espaçosas sacadas aonde vivem estes pobres
jovens. Vivem embrutecidos devido à falta de uma educação ética e sadia, além
da baixa moral que possuem.
Não
se mede o certo pelo dinheiro, pelo luxo, pelo poder, mas sim pela capacidade
que se tem de lidar com as próprias fraquezas, de se aceitar o que se tem e de
buscar mais com honestidade e dignidade. Reconhece-se que o outro está no
caminho do dar certo quando assume, sem hipocrisias, a sua condição de
incompleto e de imperfeito. A imperfeição e a incompletude são características
dos fortes e dos que estão no caminho do dar certo.
Deveríamos
ser medidos pelas perguntas que fazemos e não pelas facilidades que buscamos e
que temos, na vida. Deveríamos ser valorizados pelas construções que ajudamos a
levantar e não pelos títulos que temos, muitas vezes custeados pelos pais e sem
sentido algum.
Denegrir
a imagem dos trabalhadores expostos nas fotos, somente evidencia o conceito
torto e impreciso que estes jovens têm sobre eles mesmos.
Dar
certo é uma questão moral. É aprender a lidar com as nossas pequenezas,
incertezas e inferioridades. Isto independe da profissão e da condição social e
financeira. Mas aqueles pobres jovens, falidos em conceitos preconceituosos e
infelizes, demorarão bastante tempo para fazerem esta descoberta.
Dar
certo é assumir o nosso ínfimo tamanho frente àquilo que precisa ser feito. É
assumir que nada somos. E que o pouco que sabemos revela quem somos, como disse
o Filósofo. E aqueles pobres jovens nada sabem. Ou melhor, pouco sabem sobre a
vida. E o que pensam que sabem camufla a imagem deles refletida no espelho: uma
imagem de alguém cuja índole enferrujou.
E
não se espantem, pobres jovens, se ao
buscarem estes menosprezáveis trabalhos
por conta de nada mais ter dado certo,
vocês encontrarem as respostas para o que seja dar certo. E, espantados,
aprenderem o significado de palavras como valores, ética, moral, decência que
serão incluídas, por compaixão, no dicionário de vocês. Dicionário que não
constava naquela listinha de materiais
comprados para vocês, pelos pais, quando
iniciaram suas vidas, inclusive escolares.
Quero
encerrar este texto, mas não a reflexão, com uma provocação de Einstein, que
diz:
“Não
tente ser bem sucedido; tente, antes, ser um homem de valor.”
Dura
e necessária reflexão. O convite de Einstein e de tantos outros que vão à
frente já foi feito. Resta a nós aceitá-lo ou não. A nossa decisão será
determinante para, de verdade, darmos certo na vida.
Quando
o nosso olhar não puder mais distinguir os presidentes de Empresas e os
limpadores de rua, teremos merecido, então, ocupar um lugar na categoria dos que deram certo na vida, de verdade.