imagem tirada da internet
Um comentarista esportivo, ao se
referir a um comportamento de um atleta, disse a palavra medíocre. Fiquei com
esta palavra passeando na minha cabeça durante a semana, e resolvi escrever
sobre ela.
De origem
latina, mediocris, tinha o
significado inicial do que estava no meio, na média, mediano. Significava,
também, o que estava no meio de duas coisas. Aquele que ligava uma coisa à
outra. E o termo ocris, uma antiga
palavra que significava penhasco ou montanha. Portanto, mediocris era, simplesmente, aquele que
estava no meio da montanha, do penhasco, da rocha. Aquele que estava no meio do
caminho.
Mais tarde o
termo evoluiu para medíocre, na língua portuguesa, como grafada até hoje.
Por conta da evolução (ou involução?)
da nossa história, muitas palavras perderam o significado inicial no longo
caminho que percorreram até aqui. E a palavra medíocre faz parte deste seleto grupo
de palavras que perdeu o seu significado inicial por conta da nossa atuação.
Aonde a ação do homem chega, somente a incerteza será a nossa certeza.
Se antigamente ser medíocre não
era ofensivo, hoje, se somos chamados disto ou se chamamos alguém desta forma,
nos sentiremos ofendidos e ofenderemos. Certamente. O sentido da palavra mudou
e o que era suficiente num passado, não mais o é de algum tempo para cá. Se
antes ser medíocre apenas era estar no meio dos nossos penhascos, com direito a
nos sentir completos por conta disto, hoje isto não basta mais. É preciso subir
cada vez mais em nosso penhasco para que a mediocridade não seja impressa em
nós, como um rótulo imposto pela sociedade ou, até mesmo, por nós.
Obviamente, subir os nossos
penhascos e sairmos do lugar comum, do lugar aonde está a maioria, é
recompensador desde que haja sentido na caminhada e rota para esta escalada.
Caso contrário, será a subida pela subida. A ida a um lugar que não foi
desejado por nós.
Mesmo sabendo que o sentido
original da palavra mediocridade não carrega o pejorativo que há hoje, não tem
jeito: o “novo” sentido dado a ela veio para ficar e, claramente, não queremos
estar na categoria dos medíocres.
A mediocridade, no sentido atual,
é uma inimiga silenciosa e astuta. Ela parte, essencialmente, da forte crença
de que não é possível fazer, e que, portanto, não vale a pena insistir. Este é
o caminho, o trajeto da mediocridade como a conhecemos hoje. Mas nem sempre é
fácil reconhecê-la. Ela está arraigada na ausência do querer. A vontade é nula.
A existência é só mera coincidência do Universo, para o medíocre.
A bravura, a coragem e a
intolerância ao pequeno, sem menosprezá-lo, é, definitivamente, uma linguagem que
a mediocridade não entende.
O escritor Paulo Coelho traz um
texto que bem exemplifica o sentido da mediocridade “atual”:
Só os medíocres agradam a todos
Quando você começa a fazer alguma coisa, sempre tem alguém torcendo
contra. Se você consegue ultrapassar as primeiras dificuldades, a “torcida
contra” aumenta.
É preciso saber aproveitar isso. Não adianta querer agradar a todo
mundo. Só os medíocres conseguem isso e, mesmo assim, à custa de muito
sacrifício pessoal.
Tampouco adianta ficar ressentido ou odiar quem não o ama. Convença-se
que isso faz parte do trabalho. Use a energia da “torcida contra” para adestrar
a sua vontade, para ser mais profundo e mais sério no que está fazendo.
Aproveite.
Entretanto, se este tipo de torcida afastar você do seu caminho, é
porque este não era o seu caminho. Se fosse, só mesmo a mão de Deus poderia ter
feito alguma coisa contra.
Bela reflexão. O medíocre de hoje
é diferente do medíocre de ontem, como disse Max Gehringer. Portanto, com o
medíocre do passado, mesmo que tenha sido a gente mesmo, não havia com o que se
preocupar. Mas com o medíocre de hoje, principalmente se for a gente mesmo,
este sim é preciso cautela e muito cuidado. O silêncio dele é assustador,
imperceptível. E é exatamente esta a intenção: fazer que a gente não o perceba
ali.
O medíocre de hoje é aquele que
torce pelo seu insucesso. Desta forma, o dele não ficará tão evidente. Ele terá
com quem discutir os infortúnios da “falta de sorte”. E quando você buscar
outros caminhos para atingir o seu objetivo, o medíocre, de plantão, estará lá
firme, te desencorajando. Como seu amigo,
ele acredita que assim te ajudará a poupar mais dores.
Ele se compraz da sua
infelicidade porque ele não é feliz. Esta é a linguagem dele.
O medíocre de hoje possui a régua
muito abaixo do limite do aceitável. É aquela pessoa que não se esforça pelo
simples fato de não enxergar valor no esforço. E isto pode ser consciente ou
inconsciente. E quando você se esforça, mesmo com poucas chances de acerto,
você parece ridículo para ele. Um ser à parte. Uma pessoa que incomoda. Uma
pessoa que obriga, sem perceber, o medíocre a sair do lugar comum porque você
demonstra que há outras possibilidades e formas de ver a vida. Por isto, ele
tenta, desesperadamente, te desanimar na esperança de que você deixe as coisas como estão.
Ser medíocre não é uma escolha. É
uma condição. Para sair dela, o autoconhecimento e o amadurecimento são
caminhos transformadores. Mas o caminho mais rápido e eficiente é quando a dor,
pelos prejuízos causados pela mediocridade, começa a ser sentida por quem a
pratica.
O medíocre de hoje é sempre aquele
que tentará puxar você para baixo, para o nível da régua onde ele está. Ele
está cansado de sonhar e de acreditar na caminhada. Ele se cansou de lutar. E o
mais crítico: ele não possui lutas a serem conquistadas. E todo medíocre gosta
de uma companhia. Por isto é preciso tomar cuidado.
Fazer o melhor que podemos, sempre, mesmo que longe da perfeição, é
abrirmos mão da mediocridade.
Às vezes somos exigidos, pela
vida, a buscarmos opções de outras rotas para a realização de nossos sonhos.
Mas somente a vida tem este direito de nos desviar, temporariamente, deles. Ela
certamente nos desviou para nos fortalecer. Mais adiante ela tratará de nos
colocar no caminho, de novo, em busca dos mesmos sonhos. O medíocre não tem
este direito. Mas ele acha que tem. Por isto, todo o cuidado com ele é pouco.
O medíocre mina as nossas forças.
Ele busca nos desestabilizar. Sentimo-nos enfraquecidos em nossos desejos,
quando damos ouvidos a ele.
A submissão é a linguagem do medíocre. O pensar e o agir são
dispensáveis num mundo em que o pensar e o agir são indispensáveis.
Definitivamente o medíocre de
hoje é incompatível. Uma pessoa perdida que busca parceria. O questionamento,
para ele, é irrelevante. É uma pessoa que segue o caminho trilhado, valoriza a
conveniência e não a competência. Os interesses do outro, mesmo que
inoportunos, são a base do fazer do medíocre. Ele se contenta com a escada
pronta, não sente prazer em construí-la. A construção não faz parte do
dicionário do medíocre.
Quero encerrar este texto, mas
não a reflexão, com um pensamento de José Ingenieros, escritor, médico,
professor que diz:
“O homem medíocre é sinônimo de
homem domesticado, se alinhando com exatidão às filas do convencionalismo
social. A opinião dos outros é o que importa, são os escravos das sombras,
vivem para o fantasma que projetam na opinião de seus similares. Porque pensam
sempre com a cabeça social e não com a própria, são a escora mais firme de
todos os preconceitos políticos, religiosos, morais e sociais. Associa-se aos
milhares para oprimir os que não comungam com a sua rotina. ”
Este pensamento foi dito em 1913,
pelo escritor. Mas parece que ele acabou de escrevê-lo...
Que sejamos dignos da subida em
nossos penhascos. Firmes e justos com o nosso propósito, com o nosso sentido. E
que os medíocres do caminho apenas nos sirvam para fortalecer as cordas que
apoiarão a nossa subida. E se cansarmos e quisermos parar no meio de nossa
caminhada para descansarmos, que esta decisão seja nossa. Apenas nossa.
Boa caminhada a todos nós.